maio 11, 2025

...RENASCE O SOL INVICTO... - Jorge Antônio Vieira Gonçalves

 

Após a mais longa das noites, renasce o Sol Invicto, origem ancestral da celebração do Natal

Após a mais longa das noites, quando o mundo parecia mergulhado numa escuridão sem fim, o Sol retorna, ainda fraco, mas invencível. Esse momento, marcado pelo solstício de inverno no hemisfério norte, foi celebrado por diversas culturas antigas como o renascimento do Sol, um símbolo de renovação, esperança e continuidade da vida. É a esperança de que, mesmo a noite mais escura acabará, e a luz sempre retornará.

O mitraísmo romano, herdeiro de tradições persas mais antigas, estabeleceu uma profunda relação com o Sol, especialmente com os solstícios, isto é, a posição em que o Sol nasce no primeiro dia do inverno ou do verão. É o solstício de inverno que parece ter sido o mais importante para os nossos ancestrais, utilizado para marcar o início de um período de celebração. Durante o solstício de inverno do hemisfério norte, que ocorre por volta de 21 de dezembro, o Sol, ao meio-dia, atinge sua altura mínima no céu e começa, lentamente, sua jornada de retorno, elevando-se dia após dia no horizonte e aumentando gradativamente as horas de luz.

Esse dia, o solstício de inverno, a mais longa das noites, representava, para as antigas civilizações, o momento exato do renascimento solar, quando a natureza começava a dar sinais de que a escuridão não seria definitiva. É o prenúncio da primavera que virá, com sua fertilidade e abundância. Como bem disse Lucrécio: "A natureza de uma coisa faz outra brotar, e, da morte, uma nova vida nascer."

Mas, afinal, qual seria a relação entre o solstício de inverno e a origem da celebração do Natal ou nascimento de Cristo?

A verdade é que a data exata do nascimento de Jesus permanece um enigma insolúvel. Não há registros contemporâneos ao evento. Logo, como os relatos bíblicos não oferecem uma data para o nascimento de Jesus, e como essa data não se encontra nas Escrituras, nada impediu que o nascimento de Cristo fosse estabelecido em 25 de dezembro, assim como poderia ter sido em qualquer outro dia do calendário.

Segundo o Evangelho de Mateus (capítulo 2, versículos 1 a 16), Jesus teria nascido em Belém, no final do reinado de Herodes. Ao saber da notícia, Herodes teria ordenado a morte de todos os meninos com menos de dois anos, mas o menino Jesus, segundo a narrativa, teria escapado para o Egito.

No século VI, um monge sírio chamado Dionísio, o Exíguo, após consultar as Escrituras e cronologias romanas, fixou o nascimento de Jesus no ano 753 da fundação de Roma. Esse cálculo marcou o início da chamada Era Cristã. Curiosamente, sabe-se hoje que Herodes morreu em 749 a.u.c., ou seja, no ano 4 antes de Cristo. Só para lembrar, os romanos contavam os anos a partir da fundação de Roma, utilizando a expressão 1 a.u.c. (ab urbe condita), que significa “desde a fundação da cidade”. Logo, se Jesus nasceu sob o reinado de Herodes, seu nascimento deve ter ocorrido, necessariamente, antes da data calculada por Dionísio. Por conta desse erro histórico consolidado, Jesus nasceu, tecnicamente, alguns anos "antes de Cristo". 

Repito, qual seria a relação entre o solstício de inverno e o nascimento de Jesus Cristo?

A genialidade está aqui: quando a tradição cristã, ao se consolidar como religião oficial do Império Romano, absorve e reinterpreta as celebrações solsticiais. Natalis solis invicti, que significa “nascimento do Sol invencível”, logo é reinterpretada pela tradição cristã como o nascimento de Jesus Cristo, a luz que vence as trevas do mundo, associando-se simbolicamente e inteligentemente ao solstício de inverno.

Desde a Caldeia até os antigos construtores de catedrais, os homens leram os céus como uma espécie de manuscrito sagrado e interpretaram neles os sinais e os segredos dos ciclos da natureza. A celebração do Natal em dezembro é, portanto, herdeira direta da antiga reverência à luz que retorna, à vida que ressurge, ao Sol que, mesmo oculto, jamais é vencido.

A luz sempre foi interpretada como símbolo do esclarecimento e da razão. Quanto mais intensa é a luz, mais fácil se torna a jornada do autoconhecimento e da busca interminável pelo aperfeiçoamento. Trata-se de um exemplo poderoso da importância da linguagem simbólica presente nas antigas civilizações. Por isso, quando celebramos o Natal, com o Papai Noel vermelho da Coca-Cola, lembremo-nos de que, como nossos ancestrais, muitas vezes sem perceber, celebramos, na verdade, a antiga esperança daqueles que, há milênios, reuniam-se ao redor do fogo para aguardar o retorno do Sol.

Referência bibliográfica

BBC News Brasil. Como o 25 de dezembro se tornou o dia de celebrar o nascimento de Jesus. 22 dez. 2021. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-59736586. Acesso em: 7 maio 2025.

GONÇALVES, Jorge Antônio Vieira. Filhos das Estrelas. Disponível em: https://www.maconariacomexcelencia.com/post/filhos-das-estrelas

ASIMOV, Isaac. O império romano: história universal. Tradução de Luis Reyes Gil. São Paulo: Planeta do Brasil, 2023. 304 p. ISBN 978-85-422-2464-1. Título original: The Roman Empire.

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