Ela nasceu propriedade. Morreu com suas palavras impressas em milhões de passaportes — e a maioria das pessoas que as carrega não faz ideia de quem ela foi.
Raleigh, Carolina do Norte, 1858.
Uma menina veio ao mundo sem direitos, sem nome próprio, sem futuro.
Sua mãe, Hannah Stanley Haywood, era escravizada. Seu pai, quase certamente, o homem branco que a possuía: George Washington Haywood.
Chamaram a criança de Anna Julia. Por lei, ela não era uma pessoa — era uma posse.
Mas Anna Julia Cooper passaria a vida inteira provando que a lei estava errada. Catastroficamente errada.
Quando a liberdade chegou em 1865, ela tinha sete anos — e um desejo imenso: aprender.
Em 1868, matriculou-se na Escola Normal de St. Augustine, criada para formar professores negros. Aprendeu com fome de mundo, mas descobriu logo um limite imposto: os cursos avançados eram exclusivos para os homens.
As mulheres, diziam, só precisavam saber o suficiente para ensinar crianças ou agradar aos maridos.
Anna achou isso ridículo.
Exigiu o direito de estudar ao mais alto nível.
Eles recusaram. Ela insistiu.
Cederam — e ela superou todos os estudantes homens da escola.
Aos 23 anos, ingressou no Oberlin College, em Ohio — uma das poucas instituições que aceitavam mulheres negras.
Em 1884, formou-se em Matemática.
Três anos depois, conquistou o mestrado.
Num tempo em que o país acreditava que mulheres negras não tinham lugar na ciência, Anna provava o contrário com cada página que escrevia, com cada cálculo que resolvia.
Mudou-se para Washington, D.C., e tornou-se professora.
Em 1902, assumiu a direção da M Street High School (hoje Dunbar High School) e transformou-a numa lenda.
Sob sua liderança, os alunos estudavam latim, grego, matemática avançada e literatura clássica — enquanto o país dizia que eles só serviam para o trabalho braçal.
Seus estudantes entraram em Harvard, Yale e Oberlin, demolindo o racismo com cada diploma conquistado.
Os racistas do conselho escolar não suportaram.
Em 1906, fabricaram acusações e a forçaram a renunciar.
Mas Anna não desistiu. Continuou a ensinar. Continuou a escrever. Continuou a lutar.
Em 1892, publicou A Voice from the South, um dos primeiros livros de uma mulher negra a discutir raça e gênero na América.
Nele, escreveu:
“A causa da liberdade não é de uma raça, de um partido ou de uma classe — é a causa da humanidade.”
Décadas depois, aos 60 anos, enquanto muitos pensavam em aposentadoria, Anna decidiu conquistar um doutorado.
As universidades americanas lhe fecharam as portas. Então, ela atravessou o Atlântico.
Em 1911, começou seus estudos na Sorbonne, em Paris — enquanto trabalhava em tempo integral e criava filhos adotivos.
Em 1925, aos 67 anos, defendeu sua tese e tornou-se a quarta mulher negra da história a obter um Ph.D.
Aos 84 anos, fundou a Universidade Frelinghuysen, uma escola noturna para adultos negros em Washington.
Ensinou até quase o fim da vida. Viveu 105 anos — uma existência que atravessou a escravidão, a Guerra Civil, Jim Crow, o Renascimento do Harlem, as duas Guerras Mundiais e o nascimento do Movimento dos Direitos Civis.
Quando a Dra. Anna Julia Cooper morreu, em 27 de fevereiro de 1964, havia passado mais de um século provando algo simples e imortal:
que a mente de uma mulher negra é ilimitada,
que a educação é um direito,
que a liberdade é para todos. Se
Hoje, suas palavras viajam o mundo — impressas nos passaportes dos Estados Unidos, nas mãos de milhões que nunca ouviram seu nome.
Mas o esquecimento da história não apaga a força de uma vida.
Ela nasceu propriedade.
Morreu uma das mulheres mais educadas e inspiradoras da América.
E cada linha que escreveu, cada aluno que formou, cada barreira que rompeu — foi um ato silencioso de revolução.
Em memória de Anna Julia Cooper (1858–1964): nasceu escravizada, morreu impossível de ignorar — embora o mundo ainda tente.
Fonte: Sobre literatura: Facebook

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