novembro 08, 2025

LIBERDADE, FILOSOFIA E MAÇONARIA - Arnaldo Gonçalves






NA FILOSOFIA 

A liberdade é um dos temas centrais do pensamento filosófico e ocupa lugar de destaque nas obras de Immanuel Kant e Rudolf Steiner. 

Embora ambos a considerem fundamental para a existência humana e para a vida moral, as abordagens de ambos diferem tanto do ponto de vista dos fundamentos como das consequências práticas. 

Enquanto Kant compreendia a liberdade como uma condição necessária da razão moral, Steiner vi-a como um ideal de desenvolvimento interior e espiritual. 

Analisar essas duas perspectivas oferece-nos um panorama ilustrativo sobre o papel da liberdade na construção ética do ser humano.

Para Kant, a liberdade é essencialmente a autonomia da vontade. 

Ser livre significa agir não de acordo com impulsos sensoriais ou inclinações externas, mas conforme as leis que a razão impõe a si mesma. 

No âmbito da filosofia moral kantiana, a liberdade manifesta-se quando o indivíduo age segundo o imperativo categórico. 

“Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne uma lei universal” escreve Kant na Fundamentação da Metafísica dos Costumes de 1785. 

Embora a natureza humana esteja submetida às leis causais do mundo fenoménico, Kant afirma que, enquanto seres racionais, pertencemos também ao mundo nouménico (mundo das coisas em si), onde a liberdade é possível e real além, da nossa percepção. 

Essa dupla cidadania fundamenta a responsabilidade moral e a dignidade humana.

*Rudolf Steiner*, por sua vez, propõe uma concepção mais dinâmica da liberdade. 

Na sua obra A Filosofia da Liberdade, ele defende que o ser humano alcança a verdadeira liberdade à medida que desenvolve a sua capacidade de pensar de forma consciente e individualizada. 

Ele diz nesse texto “somente quem, através do amor ao agir, é impelido a agir, é verdadeiramente livre. 

Quem age apenas porque reconhece um dever, é, na verdade, não-livre.”

Para Steiner, a liberdade não é simplesmente um dado da razão, mas o fruto de um processo de amadurecimento interior. 

Agir livremente é agir a partir de intuições morais próprias, concebidas através de um pensar vivo e autônomo, e não apenas por obedecer a mandamentos externos ou impulsos inconscientes. 

Assim, a liberdade é tanto uma meta como uma tarefa, que exige contínuo esforço de autoconhecimento.

Comparando essas perspectivas, vemos que Kant e Steiner convergem na valorização da razão e da autonomia, mas divergem no modo como a liberdade se alcança. 

Kant concebe-a como submissão da vontade a princípios universais da razão prática, enquanto Steiner enfatiza a expressão criativa do indivíduo, guiado por intuições morais personalizadas. 

Para Kant, a liberdade é o princípio incondicional da moralidade; para Steiner, ela é a expressão singular de um Eu em constante formação e evolução espiritual.

Concluindo, a reflexão sobre a liberdade em Kant e Steiner nos revela a profundidade e a complexidade desse conceito. 

Ambos nos mostram que a liberdade é inseparável da vida moral, seja como fundamento racional, seja como realização do ser espiritual. 

Em tempos em que a autonomia individual e a responsabilidade ética se tornam cada vez mais desafiadoras, o diálogo entre essas duas visões pode nos inspirar a buscar uma liberdade que seja, ao mesmo tempo, racionalmente consciente e espiritualmente viva.

NO PENSAMENTO MAÇÓNICO

A liberdade é um dos princípios fundamentais da Maçonaria, sendo celebrada tanto como condição necessária para a busca da verdade quanto como um ideal moral que o maçom deve cultivar. 

Desde o primeiro grau de aprendiz, o iniciado é lembrado de que a verdadeira liberdade não consiste em fazer tudo o que se deseja, mas em agir com responsabilidade, guiado pela razão e pela consciência. 

Nos rituais, frequentemente se afirma:

• “A Liberdade é o direito de fazer tudo o que as leis permitem; e se um cidadão pudesse fazer o que elas proíbem, não teria mais liberdade.”

Esta frase, de inspiração iluminista, é apresentada para reforçar que a liberdade, para o maçom, está sempre em harmonia com a ordem, a moral e a justiça.

Nos trabalhos simbólicos, a liberdade também é associada à libertação interior. 

O maçom é convidado a libertar-se das paixões desordenadas, dos preconceitos e da ignorância, buscando o autodomínio e a iluminação intelectual e espiritual. 

Como diz um trecho do ritual do grau de Aprendiz:

• “A liberdade verdadeira só pode ser alcançada pelo conhecimento de si mesmo e pelo aperfeiçoamento das virtudes.”

Assim, a Maçonaria entende que a liberdade exterior só tem valor pleno quando é reflexo de uma liberdade interior conquistada através do esforço pessoal e da disciplina. 

Dizem os rituais dos graus filosóficos “que a liberdade de consciência, a liberdade de pensamento e a liberdade de palavra sejam para nós direitos sagrados, que jamais consentiremos sejam violados ou desprezados.”

Além disso, a liberdade é constantemente apresentada como um bem sagrado a ser defendido. 

Em muitos rituais, especialmente no Rito Escocês Antigo e Aceito, os maçons juram defender a liberdade de consciência e de pensamento. 

Um exemplo simbólico forte aparece quando se afirma:

• “Que a liberdade de pensar e de crer, dom supremo da Razão e da Consciência, seja preservada contra toda tirania.”

Nesse sentido, a Maçonaria vê na liberdade não apenas um direito pessoal, mas um dever coletivo, comprometendo seus membros a lutar contra a opressão, a ignorância e o fanatismo, sempre em nome da dignidade humana e do progresso da humanidade.

Já noutro rito – o francês – diz-se “a Maçonaria proclama a liberdade como direito inalienável do homem e ensina que somente o conhecimento e a virtude podem libertá-lo verdadeiramente.”

A visão passada no rito francês é que o homem livre é aquele que domina as suas paixões, conhece-a si mesmo e se orienta pela luz da razão — valores herdados diretamente do espírito do Iluminismo que inspirou a Maçonaria Moderna, especialmente a francesa.

No Rito Memphis-Misraïm, a liberdade é um princípio essencial que transcende a liberdade política ou social, sendo vista como um direito sagrado do ser humano, mas também uma responsabilidade moral. 

O maçom deste rito é constantemente chamado a ser um defensor da liberdade de consciência, atuando como um guerreiro contra a ignorância, a superstição e a tirania. 

Em um dos trechos ritualísticos, afirma-se: “o maçom de Memphis-Misraïm deve ser o apóstolo da liberdade, da razão e da verdade. 

Quebre as cadeias da ignorância e da tirania, e ilumine-se na luz da Sabedoria”. 

Aqui, a liberdade não é apenas um ideal político, mas também um processo interior de libertação do espírito e do despertar da consciência.

CONCLUSÃO

Em conclusão, a liberdade, tanto na filosofia quanto na Maçonaria moderna, surge como um princípio essencial, mas de compreensão profunda e multifacetada. 

Para filósofos como Kant e Steiner, a liberdade é o alicerce da moralidade e do autoconhecimento, exigindo uma constante luta pela autonomia da vontade e pela consciência ética. 

Na Maçonaria, especialmente no contexto dos ritos mais elevados, a liberdade não se restringe ao simples direito de ação, mas se expande para o domínio da liberdade interior, da liberdade de pensamento e do despertar espiritual. 

A Maçonaria moderna, inspirada pelos ideais iluministas e filosóficos, propõe ao maçom a missão de buscar a verdade, a justiça e a razão, libertando-se das cadeias da ignorância e da tirania. 

Assim, a liberdade, em sua mais pura forma, é compreendida como a capacidade do ser humano de agir com plena consciência, de trabalhar pela transformação interior e de construir uma sociedade mais justa e iluminada. 

Tanto na filosofia quanto na Maçonaria, a liberdade não é um fim, mas um processo contínuo, que exige coragem, reflexão e compromisso com os princípios universais de verdade e fraternidade.



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