janeiro 23, 2021

MINHAS EXPERIÊNCIAS AÉREAS - PARTE 2


 Minhas experiências aéreas – parte 2

O problema de escrever sobre memórias é que elas alçam voo sozinhas. A intenção quando iniciei era contar o meu relacionamento com aviões, mas as lembranças decolaram e foram muito mais longe. Que seja! Quem tiver paciência de ler vai compartilhar esta viagem pelo meu passado, como se estivesse no assento ao meu lado.
Depois da experiência como corretor de imóveis fui trabalhar nos Supermercados Soares, dos irmãos Sandoval, José, Valdeci, Ruberval e Jair que cresceram de maneira explosiva passando de uma pequena loja (na origem uma barraca de feira em Pedro Gomes) para 13 grandes lojas. Sandoval, o presidente, foi um dos empresários mais honestos e um dos homens mais decentes que conheci na vida, meu padrinho da maçonaria. Eu era o faz tudo na empresa, assessor, secretário, braço direito e esquerdo, e morava em um amplo apartamento em cima da loja da Av. Mato Grosso para estar à disposição 24 horas por dia, o que era literal. Eu trabalhava de manhã até a noite, sábados, domingos e feriados. Comecei a viajar de avião acompanhando José, que era o relações públicas da empresa, para congressos, feiras e eventos. Ele era simpático, bem apessoado e rico e fazia enorme sucesso com as mulheres, o que acabou por comprometer o seu casamento.
Ao deixar a empresa, com o apoio e as bênçãos do Sandoval montei uma das primeiras lojas de 1,99 do Brasil, na Av. Calógeras quase esquina com a Afonso Pena, em frente onde hoje é o Bradesco e que se chamava Panela Velha. Estava arrumando a loja no domingo para inaugurar na segunda-feira com as portas abertas. Eis que entra Sérgio Reis, a caminho de sua fazenda em Pedro Gomes, precisando de uma quinquilharia qualquer. Era o meu primeiro cliente. Durante a conversa com o simpático ídolo eu lhe disse, em um rompante de valentia, que iria batizar a loja com o nome de fantasia de Panela Velha, em homenagem ao estrondoso sucesso que essa música fazia na ocasião e ele prometeu que voltaria para fazer uma apresentação gratuita para mim. Ele nunca mais voltou mas o nome deu sorte e loja foi muito bem por muitos anos.
Eu havia montado algum tempo depois as agências da TAM, mas não existiam computadores, raríssimos e caros e todo o complexo controle financeiro e logístico dos voos era feito à mão. Havia dois funcionários em tempo integral fazendo isso. Decidi que não compensava mais ter as agências e as transferi para outra pessoa. Investi em um estacionamento na Av. Mato Grosso na frente ao Colégio D. Bosco e me tornei sócio de um restaurante e casa noturna chamada Spazio, em frente à igreja matriz, onde cantavam Alzirinha Espíndola, Almir Sater e outros talentos locais. Ainda tive uma revenda de jeans e de joias, que se transformaria na Brilhante Joias, em sociedade com o Zelão de Coxim, revenda e indústria, que seria durante anos o meu negócio principal.
Eu me tornara diretor da Associação Comercial de Campo Grande e da Federação das Associações Comerciais de MS. Uma chapa alternativa presidida pelo empresário Vagner Simone Martins, meu vizinho na Avenida Mato Grosso, havia vencido as eleições derrotando um grupo que há décadas comandava a instituição e vários empresários jovens e ativos como eu faziam parte da diretoria, junto naturalmente com alguns antigos e prestigiadíssimos medalhões como Nelson Nachif. Passei a voar com frequência para representar a entidade em encontros, congressos e feiras. Numa dessas viagens conheci Brasília e me apaixonei pela cidade à primeira vista. Pensei – “quem sabe, algum dia, poderei vir morar aqui.”
Adelino Martins, dono da Floricultura Arakaki, que também era diretor da Associação Comercial me levou para o Rotary Clube de Campo Grande Norte, o maior Rotary do Distrito, e permaneço rotariano até hoje. Anos mais tarde fui presidente do Clube, da Associação dos rotarianos de Campo Grande, vendi a luxuosa, caríssima e inútil sede na cobertura de um edifício e ganhei do Prefeito Lúdio Coelho um grande terreno situado em um bairro nobre onde seria construído um consultório dentário para atender aos menos favorecidos. Estive há pouco mais de um ano em Campo Grande e fiquei muito triste ao ver que nada aconteceu no terreno e que o meu Rotary do coração está bem pequeno, embora conte com valorosos companheiros.
Aldoir Pedro Teló, pai do Michel Teló, também era meu vizinho na Avenida Mato Grosso, proprietário da Padaria Espanhola e foi meu vice-presidente na minha gestão rotária. Michelzinho desde muito pequeno era um ótimo cantor e instrumentista e animava as festas de nosso Clube. Eu disse ao Aldo que Michel viria a ser um grande artista. Não era difícil prever quando se via tanto talento e carisma no garoto.
A fábrica de joias estava estabelecida em uma casa vizinha à minha e funcionava a pleno vapor. Eu tinha cerca de 30 revendedoras de porta em porta. Estavam na moda na época as leves joias chamadas de “ouro italiano” que eram comercializadas em até 10 pagamentos, porque a economia era estável e o país estava em acelerado desenvolvimento. Eu vendia para outras cidades do Estado de MS e até para S.J. do Rio Preto em SP. O Zelão fornecia os diamantes, eu os lapidava em São Paulo e Petrópolis para transformá-los em brilhantes e montava em armações de ouro 18, metal que adquiria em São Paulo e Cuiabá. Já era um tipo de comércio “globalizado”. Meu ourives chefe, Zequinha, cearense de Juazeiro do Norte, terra de Padre Cícero, era dedicado e habilidoso e ensinou a profissão a muitos outros jovens que contratei. Peças mais caras e elaboradas eu adquiria do cuiabano Denis Correa Fortes que tinha uma belíssima produção de peças sofisticadas na Joias Denis, na Avenida Sumaré em São Paulo.
Mas a certa altura começamos a ter problemas de segurança. Algumas revendedoras foram roubadas, um dos meus veículos foi acidentado e se perderam muitas joias e valores, um dos meus clientes foi assassinado e preocupado com o crescendo da insegurança doei os equipamentos da fábrica aos empregados e encerrei as atividades da joalheria.
SEGUE

janeiro 22, 2021

MINHAS EXPERIÊNCIAS AÉREAS - PARTE 1


 Minhas experiências aéreas - parte 1

Voei pela primeira vez em 1966, quando um colega de classe, Cory Ronald Blume de Araújo, que era instrutor do Aero Clube de Sorocaba, muito ativo na época, me levou para um voo panorâmico sobre a cidade. Voei mais algumas vezes com ele em domingos. Fiquei muitos e muitos anos sem voar, até a minha mudança para Campo Grande, MS, em 1976, quando fui trabalhar como corretor de imóveis com Alípio Rodrigues, então dono da Imobiliária Radar e nas horas vagas piloto de acrobacias. Alípio chegou a comprar um avião para realizar o que na época eu considerava loucuras. Ele fazia as mesmas manobras realizadas pela Esquadrilha da Fumaça, mas jamais se acidentou com o avião. Veio a falecer recentemente em um banal acidente de automóvel.
Também cheguei a dar um voo com o piloto que tinha o brevê de aviador número 1 do país, Comte. Rocha, e que era então esposo de minha secretária Rosangela. Mas tive contato mais frequente com aviões no Mato Grosso do Sul quando encontrei o querido amigo Francisco Antônio van Spitzenbergen, que todos conheciam por Chico Piloto e que voava para o empresário José Adelino de Carvalho, o Zelão de Coxim, que era nosso patrão em comum. Zelão tinha supermercados, máquinas de arroz, concessionária de automóveis, mas seu negócio principal era o garimpo de diamantes em Poxoréu, Torixoréu e outras localidades. Era um dos maiores comerciantes da pedra preciosa no país e voava continuamente para seus garimpos. Eu era sócio minoritário da Brilhante Joias em Campo Grande, de sua propriedade, e voei muitas vezes de Campo Grande para Coxim em seu avião. Meu amado amigo Chico veio a falecer muitos anos depois em um acidente aéreo pilotando seu próprio avião em MT.
Através do Alípio conheci o Cel. Aral Cardoso, cuja mãe recebeu um honroso título da Aeronáutica, porque seus seis filhos se tornaram pilotos, alguns militares e outros civis. Tenho um livro que conta a história da família, e através do Aral fui apresentado ao Angelo Coló, de família sorocabana e que era o agente da Vasp na cidade. Nos tornamos bons amigos. Coló era conhecido do Comte. Rolim, da TAM, e este lhe ofereceu a representação da sua empresa aérea. O contrato com a Vasp não permitia, ele me apresentou ao Comte. Rolim e acabei me tornando o agente da TAM em Campo Grande, Três Lagoas e Ilha Solteira, e passei a voar com frequência nos apertados aviões Bandeirantes e depois nos Fokker.
Os voos para São Paulo através de Araçatuba e Bauru ou através de Londrina eram diários, exceto aos domingos. O Bandeirante chegava a Campo Grande no sábado e decolava na segunda. Tive a ideia de fazer uma conexão para Porto Murtinho, um dos paraísos de pesca no Brasil, em parceria com um belíssimo hotel na beira do Rio Paraguai que pertencia à família Baís. O voo levava o grupo de pescadores no sábado para uma semana de pescaria e trazia de volta o grupo da semana anterior. Na primeira temporada de pesca a linha foi um sucesso, mas fora da temporada não havia demanda e Rolim acabou por desativá-la. Foi o fim de minha efêmera experiência como empreendedor aéreo. Ainda permaneci como agente da TAM por alguns anos, mas eu tinha outros negócios em vista, montei uma loja e a agência tomava tempo demais. Pesei os prós e contras e devolvi a representação, mas permaneci amigo do Comte. Rolim até a sua morte em Pedro Juan Caballero.
A TAM tinha sua agência principal na Av. S. Luiz com a Major Quedinho, na galeria do prédio onde funcionava o Hotel Jaraguá e o jornal O Estado de S. Paulo, e Rolim que era louco pela Pantanal me pediu para organizar uma exposição de fotografias na agência com um coquetel, quando da inauguração da linha de Porto Murtinho. Ele convidaria a imprensa para documentar. Organizei um belo evento e recebi da TAM um voucher para hospedagem no Hotel Hilton, que era próximo e dava para ir a pé. Depois da festa, ao retornar ao hotel descobri que o frigobar estava trancado. Liguei para a portaria e alguém me disse, que por estar hospedado como cortesia, não tinha direito ao frigobar.
Comentei o fato com o Comandante no dia seguinte e ele ligou para o gerente do hotel dizendo que quando dava uma cortesia de voo para os funcionários do hotel ele não mandava cortar o lanche servido nos aviões e me orientou a descrever o fato numa carta que iria encaminhar. Fiz isso e a partir daí passei a ser assediado pela gerência do Hilton me convidando insistentemente para voltar ao hotel. Retornei a SP dois meses depois e fui atender o convite. Já havia uma ficha minha com um enorme carimbo VIP. Fui encaminhado para uma suíte maravilhosa cuja cama tinha uns 3x3 mts. Havia uma grande cesta de frutas no quarto, vinho, champanhe e uma necessaire com todo tipo de perfumarias e cosméticos personalizados, um bilhete dizendo que tudo era cortesia e ainda um convite para jantar com o gerente. Durante o jantar o gerente me contou que a carta havia pousado na matriz nos Estados Unidos e por se tratar de documento enviado pelo dono da maior empresa aérea do país criou uma revolução. A ordem era que eu, a vítima, deveria me retratar por escrito ou as consequências seriam sérias. Por isso aquela mordomia toda. Passei uns três dias com vida de milionário, escrevi a tal carta dizendo que estava satisfeito e nunca mais voltei ao Hilton, mas devo destacar o cuidado com que eles tratam o hóspede desde a matriz e o enorme prestígio internacional do Comte. Rolim. Vi ainda outras coisas com o Comte., um notório paquerador, mas o respeito à sua memória e a sua família jamais permitirão que eu as conte.