fevereiro 09, 2021

O Triunfo dos Relógios - uma história do tempo contado

 

O triunfo do tempo

A partir do século XIV a Igreja deixou de controlar o tempo de seus campanários. A incipiente sociedade industrial necessitava de novas pautas horárias não associadas ao Sol.

A Igreja e a Burguesia Mercantil

Os céus da Europa todavia são testemunhos daquela guerra. A força com que a igreja rivalizava com a sociedade. Hoje já quase ninguém levanta a cabeça para ver as horas. Os relógios de pulso ou os celulares tiram essas dúvidas. Porém, durante a Idade Média os relógios das torres eram as únicas referências temporais das pessoas. A partir do século XIV a burguesia mercantil, motor da atividade econômica do momento, propôs tirar da Igreja o monopólio do tempo. A nova realidade laboral exigia um método mais rigoroso das horas.

As divisões do tempo para a Igreja, as vigílias

A Igreja havia herdado parte do sistema horário do mundo romano, onde as doze horas que marcavam os relógios solares dividiam-se em quatro partes iguais. A “prima” era a primeira hora desde o amanhecer (que, dependendo da estação, poderia ocorrer as 4:30 ou as 7:30) até a terceira, ao meio da manhã; a “tertia”, até o meio-dia; a “sexta”, até o meio da tarde (coincidia com a hora mais quente, onde se aproveitava para fazer a “siesta”); e a “nona”, até o pôr do Sol (em inglês, a palavra “afternoon remete a uma antiga faixa horária). As doze horas da noite também eram divididas em quatro períodos conhecidos como “vigiliae”, igualmente variáveis em função da estação. Recebiam os nomes de “prima vigilia”, “secunda vigilia, “tertia vigilia” e “quarta vigilia”.

Horas canônicas ou Instantes de Deus

Os monges da Idade Média adaptaram esta divisão de tempo em suas ocupações espirituais. O resultado foram as sete horas canônicas destinadas a oração, e conhecidas por eles como “instantes de D’us”. Eram as “matines”, pouco depois da meia-noite; as “laudes”, na aurora, momento em que se rezava um salmo que continha de maneira constante o imperativo “laudate” (load), de onde vem o nome; a “prima”, a “tertia”, a “sexta” e a “nona”, de tradição romana; e as vésperas, ao meio da tarde, depois do pôr do Sol. O italiano São Bento (480-547), fundador da vida monástica no Ocidente, foi o promotor desta divisão. Baseou-se no Salmo V do Antigo Testamento, que diz: “Ore sete vezes ao dia”. Com o tempo, surgiria uma oitava hora, para dar graças a Deus antes de ir para a cama.

Relógios primitivos: solar, vela, clepsidra e areia.

Relógio a vela

Em noites e dias nublados, quando o relógio solar não tinha nenhuma utilidade, recorria-se a diversos sistemas para calcular as horas canônicas. No relógio de vela o tempo era marcado pelo consumo de uma delas. Também poderia ser utilizada a clepsidra (ladrão de água, em grego). Este relógio, conhecido também dos egípcios, era formado por dois recipientes: um deles tinha água que caía de um orifício a outro. O nível da água que escorria indicava as horas, o qual trazia um problema. A velocidade do fluxo dependia da pressão da água, e esta pressão variava em função da quantidade de líquido que estava no recipiente. Igualmente impreciso era o relógio de areia, um recipiente de vidro formado por duas ampolas unidas a dois vértices. Através dessa parte central passava certa quantidade de areia de um a outro bulbo. Uma vez acabado a passagem, era necessário virar o recipiente para continuar a contagem do tempo.

São Bento: “O ócio é inimigo da alma” – Surgia o Negócio.

Na medida em que a Igreja foi se consolidando como a instituição mais poderosa da Europa medieval, o controle do tempo ficou sob seu domínio. Tinha-se muito presente a máxima de São Bento: “O ócio é o inimigo da alma”. Os trabalhos dos monges serviam para anunciar as horas canônicas, e também para marcar as rotinas diárias das pessoas. A partir do século XIII, com a aparição dos relógios mecânicos, a Igreja assegurou-se de que a população pudesse cumprir de uma maneira mais estrita seus deveres com Deus. Difundia-se assim a regra beneditina “ora et labora” (reze e trabalhe).

Primeiro relógio mecânico

Abadia de DunstableO primeiro relógio mecânico conhecido foi instalado em 1283 na abadia de Dunstable, na cidade inglesa de Bedfordshire. Constava de duas rodas dentadas que se enroscavam uma com a outra graças a um mecanismo chamado “escape”, impulsionado por um peso. O movimento constante do “escape” é a fonte do famoso “tic-tac”, que converteu-se desde então na voz do tempo. Estes primeiros relógios, instalados em torres, não mostravam as horas, só soavam.

Relógio com ponteiro e astronômico

Relógio AstronômicoNo século XIV, a hora começou a ser visualizada graças a introdução de uma agulha no centro de uma esfera numerada. Seu inventor, o astrônomo italiano Jacopo Dondi, popularizaria este sistema ao fabricar em 1344, em Pádua, o primeiro relógio astronômico, que além de marcar as horas, ainda marcava os movimentos do Sol, da Lua e dos planetas. De todo modo, os primeiros relógios mecânicos eram caros e imprecisos. A temperatura afetava na dilatação de suas peças metálicas, fazendo-lhe sofrer variações entre 15 e 30 minutos por dia, sendo necessário regulá-los diariamente. E, os relógios solares continuaram desempenhando um papel notável.

O relógio regendo o trabalho dos agricultores

Na Espanha, o primeiro relógio mecânico foi o da catedral de Barcelona. Conhecido como “el seny de les hores” (em catalão antigo “seny” significava tanto “torre” como “sinal”), data de 1393. Com a propagação deste tipo de relógio, pouco a pouco a vida cotidiana das cidades do Ocidente foi sendo modificada. A jornada laboral de um agricultor sempre variava muito ao longo do ano, já que estava sujeita a luz solar, que dependia da estação. Em geral, trabalhava de sol a sol. Os campanários das igrejas tinham certos estandartes horários, mas não eram muito regulares: os toques da “prima” e “vésperas” coincidiam com o amanhecer e o crepúsculo, e a partir destes estabeleciam-se outros toques, com os quais só no equinócio obtinha-se períodos homogêneos. Além disso, os toques dos sinos podiam variar de uma igreja a outra, o qual causava uma grande confusão.

O relógio e a sociedade industrial

Com a incipiente sociedade industrial da Baixa Idade Média (séculos XI-XV), as oito horas canônicas perderam sentido. O trabalho já não podia ser regulado pelo tempo das Igrejas, mas por horas concretas. Não em vão, descobriu-se que o tempo de produção de um produto poderia ser adicionado a seu preço, assim como também o pagamento dos trabalhadores. Iniciou-se então uma guerra não declarada entre a Igreja e a burguesia por seu controle. Uma data chave nesta disputa foi o dia 24 de abril de 1355. Nesse dia, o rei francês Felipe VI concedeu a Amiens a faculdade de indicar, através do toque de um sino, as diferentes ocupações do dia: o momento de ir trabalhar, do descanso para comer, do retorno aos trabalhos e de sua finalização. Dado que estes primeiros relógios davam as horas através do som de um sino, não é estranho que a palavra francesa “cloche” (torre) seja a raiz da palavra relógio em inglês (clock) e alemão (Glocke). O nosso, deriva do grego “horologion” (indicador de horas, “horologium” em latim), o relógio solar. A variedade cuja sombra, projetada sobre uma escala gradual, indica a hora denominada “gnomon”. Dela procede a palavra gnomônica, disciplina relacionada com a elaboração de relógios solares.

Carpe Diem

Os avanços tecnológicos não tardaram em catapultar o ofício de relojoeiro. Seus serviços eram muito procurados. Não paravam de viajar de cidade em cidade construindo grandes relógios mecânicos que instalavam nas torres dos edifícios civis. Todos os grêmios tinham claro os toques que marcavam sua jornada de trabalho. Assim, pouco a pouco, o tempo não só tornou-se independente do Sol, como também secularizou-se, ou seja, separou-se da Igreja. Foram muitos os pensadores do momento interessados na construção de relógios. Com o homem como centro do universo no lugar de Deus, tratava-se de um instrumento muito em sintonia com a máxima latina “carpe diem” (aproveite o dia), que viveu um momento de glória no Renascimento. Desta época, um dos relógios laicos mais famosos é o astronômico de Praga, criado no século XV.

Relógios portáteis

A partir desse século, os relógios perderam peso e surgiram os primeiros dispositivos portáteis. Não existia mais só aquele ponto fixo para ver as horas. Para este avanço, foi necessário substituir o pendulo por uma mola, muito mais rápida. Os progressos tecnológicos levaram em 1509 Peter Henlein, um alemão de Nuremberg, a fabricar os primeiros relógios de bolso que se tem notícia, apelidados de “ovos de Nuremberg” por seu formato. Funcionavam somente por 40 minutos, alguns deles foram autênticas obras de arte. Os relógios, acabaram sendo objetos de luxo, assim com o tempo só as classes privilegiadas os possuíam. Enquanto isso, as outras pessoas dependiam do quadrado das fachadas onde era projetada as sombras dos relógios solares (que por isso são conhecidos também como quadrantes solares). Haviam sido aperfeiçoados graças as contribuições dos astrônomos e matemáticos árabes.

O relógio de pêndulo

Christiaan HuygensNo século XVII foi dado um grande passo na contagem de tempo. O matemático e físico holandês Christiaan Huygens construiu em 1657 o primeiro relógio de pêndulo. Este invento, muito mais preciso que os anteriores, foi possível graças aos princípios de movimentos oscilatórios estudados anos antes pelo astrônomo Galileu Galilei. Huygens dividiu a hora em 60 minutos e estes em 60 segundos. Recuperava com isso o sistema de numeração sexagesimal dos antigos sumérios fazendo derivar para o duodecimal. Cada vez que o homem contava com o polegar da mão esquerda a dezena de falanges dos dedos restantes (de onde procede a divisão do dia e da noite em doze horas respectivas), levantava um dedo da mão direita, o que só era possível cinco vezes. Assim, a contagem total era de 12×5=60. Enquanto a palavra minuto, era uma simplificação da expressão latina “pars minuta prima” (primeira parte pequena), enquanto que segundo derivava de “partes minutae secundae” (pequenas segundas partes).

O relógio cuco

Primeiro cucoA criação do pêndulo aumentou a demanda de relógios, e ainda por cima também deu lugar a sua integração nos móveis das casas. Isto começou a partir do século XVIII com os relógios de cuco. Desenvolvidos pelos carpinteiros da Floresta Negra alemã, estes relógios com pêndulos tinham como peculiaridade um pássaro automático que a cada meia hora aparecia pela abertura emitindo um “cuco” pelo quais ficaram conhecidos.

O despertador

Em meados do século na Inglaterra, com a Revolução Industrial, culminaria o processo de apropriação do tempo que havia sido iniciado pela burguesia na Baixa Idade Média. O proletariado, que trabalhava tanto em turnos diurnos como noturnos, estaria dependente dos minutos e segundos marcados pelos relógios que pendiam das paredes das fábricas. Então generalizou-se os despertadores domésticos, que asseguravam a chegada pontual aos postos de trabalho. Da ótica capitalista, as horas eram fonte de benefícios. Não havia, pois, tempo a perder. De fato, algumas expressões ficaram famosas como “o tempo vale ouro”, atribuída ao escritor britânico Edward Bulwer-Lytton.

O relógio de pulso

Os relógios de pulso mecânicos apareceram no final do século XIX, mas inicialmente tiveram menos êxito que os de bolso, pois os homens achavam similares as joias que as damas utilizavam. Popularizou-se somente após a Primeira Guerra Mundial. No conflito, os atiradores optaram por enrolar os relógios de bolso nos braços, para ter as mãos livres durante as operações. Depois da guerra continuou os avanços tecnológicos através da invenção de sistemas cada vez mais precisos.

O relógio a quartzo

Desde o final do século XIX descobriu se que o quartzo tinha propriedades piezoelétricas. Em 1920 foi utilizado pela primeira vez em um relógio, mas só ficaria popular após os anos 1960. Graças a eletricidade proporcionada por uma pilha, um cristal deste mineral gera vibrações em intervalos regulares que permitem uma medição altamente precisa do tempo.

O relógio atômico

Relógio atômicoNo final dos anos quarenta chegamos a exatidão horária com a aparição dos primeiros relógios atômicos, baseados na vibração dos átomos de determinados elementos como o Césio, o Hidrogênio ou o Estrôncio. Os sinais acústicos das transmissões radiofônicas são coordenados através deste tipo de relógio, até agora os mais precisos. Atrasam um segundo a cada 20 milhões de anos. O progresso, nos levou a busca do segundo exato. Após uma longa jornada através das horas ditadas pelos “relógios de Deus”. Agora, somos escravos da sofisticação horária.

Imitamos muitas vezes o coelho branco de “Alice no País das Maravilhas”, o personagem de Lewis Carroll que olha sem parar seu relógio, atormentado pela falta de tempo. Isto já foi objeto de reflexão para incontáveis filósofos. Kant dizia que “o tempo não é mais que um meio que utilizam nossas mentes para organizar as experiências que vivemos”. Para Einstein, “o tempo é o que você vê no relógio“. Contava o sociólogo e antropólogo francês Pierre Bourdieu que, nos anos cinquenta, os camponeses berberes da região argelina de Cabília chamavam o relógio de “moinho do demônio”. Naquela região, falar a hora exata é inclusive falta de educação.

BIBLIOGRAFIA

DOHRN-VAN ROSSUM, Gerhard. History of the Hour: Clocks and Modern Temporal Orders. Chicago (EUA): Univ. of Chicago Press, 1996.
GIMPEL, Jean. La revolución industrial em la Edad Media. Madri: Taurus, 1982.
LANDES, David S. Revolución em el tempo. Barcelona: Crítica, 2007.

Deivid Miranda, Historiador

fevereiro 08, 2021

É COMO O ORVALHO DO HERMON, QUE DESCE SOBRE OS MONTES DO SIÃO

MONTE HERMON A ligação entre o povo judeu e as Colinas do Golã remonta aos tempos bíblicos. Diz a tradição judaica que foi no Monte Havtarim, na região do Monte Hermon, a 1.296m acima do nível do mar, nos declives de Katef Sion, que D’us prometeu a Abrão que lhe daria a terra para seus descendentes. Um antigo túmulo marca o local e um robusto carvalho ergue-se, ao lado. “Os olhos de Israel”. Assim é carinhosamente chamado o Monte Hermon, ponto culminante do país, localizado no topo da Cordilheira do mesmo nome, entre a fronteira de Israel e a Síria. Assim denominado por causa de seus picos, é um dos principais centros de prática de esportes de inverno. Com 2.224m, foi o local escolhido para a implantação de um centro de lazer para turistas e amantes do esqui, pois a neve faz parte da paisagem natural da área de novembro a março, cobrindo de branco os picos do Hermon. De suas encostas, que degelam após o inverno, nasce o rio Jordão. Nos dias claros de verão, do alto das montanhas, tem-se uma das vistas mais belas da Galiléia. A região é apreciada também por outro tipo de turistas, além dos esquiadores: os observadores de pássaros. Por sua altura e a existente fauna e flora, é considerada uma das melhores áreas da região. Fundamentalmente estratégicas para a defesa do país, somente após a Guerra dos Seis Dias, em 1967, as Colinas do Golã e o Monte Hermon passaram do controle sírio para o de Israel, inaugurando uma era de tranqüilidade como não conhecia, há décadas, a população israelense do norte do país. Vestígios da antigüidade Dizem os historiadores que a região sempre foi disputada pelos povos que lá viveram. Os amoritas a dominaram do 3º ao 2º milênio antes da nossa era, quando foram derrotados pelos arameus. Posteriormente denominada Bashan, foi uma área disputada pelo reino de Israel e o dos arameus, a partir do ano 800 a.E.C. A partir daí, se seguiram constantes trocas de poder: assírios, babilônios, persas. No século V a.E.C, a região volta a ser povoada pelos judeus que retornavam do exílio da Babilônia. Alexandre, o Grande, conquistou as montanhas no século IV antes desta era, mantendo-as sob controle helenístico até sua captura pelos romanos. É quando passa a ser chamada de Golã. Os gregos costumavam referir-se às redondezas como “Gaulanistis”, termo usado pelos romanos, daí o nome Golã. A 1ª. Revolta Judaica contra as forças de Roma aconteceu de 66 a 73 da Era Comum, quando um grupo de judeus ocupou a colina de Gamla. Estes foram derrotados e a cidade, destruída. O local tornou-se conhecido como “A Massada do Golã”. Durante o reinado dos romanos, chegaram os gassânidas, em 250 da E.C. e construíram sua capital em Jabiyah. Dividido o Império Romano, em 391, as Colinas do Golã ficaram sob influência bizantina e controle dos gassânidas. Depois vieram os sassânidas e mais tarde os árabes muçulmanos, sob domínio omíada, iniciando um novo capítulo na história local. Os druzos começaram a chegar ao norte do Golã e arredores do Monte Hermon a partir do século XV, seguidos um século depois pelos turcos otomanos, que lá permaneceram até o final da 1ª Guerra Mundial. Em 1880, um grupo de pioneiros sionistas fundou um núcleo judaico denominado Ramataniya, que desapareceria em apenas um ano. Finda a 1ª. Guerra, em 1920 o destino do Golã é definido por um acordo entre França e Grã-Bretanha, que concedia aos primeiros o controle sobre a maior parte do território. Isto ocorreu somente em 1924, um ano após os ingleses assumirem o mandato sobre a então Palestina. Ainda pelo mesmo tratado, uma pequena parcela do território passou da Síria para a Palestina. Assim, a França estendia seu mandato sobre a Síria. Ao término deste, em 1944, este último país fica com o controle da área. Logo após a Independência de Israel, em 1948, Damasco aumenta sua presença militar nas colinas, de onde atacava constantemente a população civil israelense do norte do país. Depois de assinado o armistício em 1949, entre israelenses e sírios, parte da área foi desmilitarizada, mas as violações destes últimos continuaram até 1967, quando Israel ocupa a região, pondo fim a 18 anos de bombardeios sobre seus cidadãos. Atualmente, 18 mil pessoas moram na região do Golã, em 35 povoados Trilha das sinagogas Um dos símbolos mais conhecidos do legado judaico na região é o povoado de Gamla, destruído durante o ano 67 da E.C., durante a 1ª Revolta Judaica. A escavação da cidade e sua identificação só foram possíveis após 1967. Para os visitantes, transformou-se em interessante ponto turístico. Para os estudiosos, a mais importante evidência da vida judaica no Golã, durante a Antigüidade, e da política destrutiva dos Césares contra os povoados judaicos. Tal perspectiva, no entanto, só voltou a ser estudada quando o arqueólogo Haim Ben-David aprofundou suas pesquisas sobre as ruínas das comunidades judaicas, no Golã, do período mishnaico e talmúdico. Como parte de sua investigação, analisou artefatos encontrados em mais de 50 sítios, habitados entre o século I a.E.C. e o século VI. Ben-David datou cuidadosamente cada um dos fragmentos, ressaltando que, diferentemente de outros sítios arqueológicos do período romano-bizantino, os mínimos detalhes encontrados na região do Golã eram cruciais para uma compreensão da história local. Após estudar cerca de 6 mil fragmentos, chegou a uma conclusão surpreendente: “Gamla foi o único povoado destruído durante a 1ª. Revolta Judaica…. As evidências indicam que pelo menos 25 continuaram a existir… e suas ruínas estão no que hoje se conhece como Ein Nashut, Yehudiya Dir Aziz”. O arqueólogo concluiu, também, que, nessa região central encontra-se um padrão contínuo de vilarejos judaicos desde o período do Segundo Templo até o final do domínio bizantino; e que alguns ainda se estenderam pelo início do período islâmico, em meados do século VIII. No entanto, Ben David faz questão de ressaltar que sua conclusão não significa que todos os povoados judaicos sobreviveram até o domínio bizantino; demonstra apenas que aqueles cujos vestígios foram encontrados não foram destruídos nos confrontos. O estudioso encontrou sinais de 15 assentamentos judaicos abandonados no século IV, final do período romano. Segundo suas pesquisas, os povoados iam sendo abandonados à medida que os bizantinos ocupavam as terras mais férteis do Golã. Os judeus, por sua vez, foram-se concentrando em áreas cada vez mais remotas, distanciando-se, gradativamente, do poder central. As análises do arqueólogo também levaram à conclusão de mais uma característica comum entre tais povoados: a presença de edifícios públicos elaborados, incluindo-se sinagogas bem decoradas, geralmente nos pontos mais altos das montanhas. Outra forte marca da presença judaica nas regiões mais remotas do Golã foi a descoberta de uma sinagoga nas ruínas do vilarejo sírio de Dir Aziz, próximo ao Moshav Kanaf. Era parte de um assentamento judaico, datado do século I desta Era. Foi justamente na área em que começaram a se delinear as primeiras teorias de Ben-David sobre as antigas comunidades do Golã. Antes dele, no entanto, o explorador Laurence Oliphant, em suas andanças pela Terra Santa, em 1885, já mencionara a existência de uma sinagoga no local. Descreveu a fachada ocidental do edifício, com 3m de altura, então intacta. Somente após 1970 iniciaram-se trabalhos arqueológicos mais intensos. Mas os primeiros pesquisadores não encontraram a sinagoga, provavelmente em virtude de um terremoto na área, em 1920, que a teria posto abaixo. Zvi Ilan foi o primeiro a coordenar as pesquisas, seguido, décadas depois por Zvi Maoz, do órgão responsável pelo patrimônio de Antiguidades, em Israel. As informações iniciais de Oliphant foram confirmadas: em Dir Aziz, de fato existira uma sinagoga. Por insistência de Ben-David e Maoz, as escavações foram retomadas em 1998, quando finalmente se encontrou a estrutura da sinagoga. Bem conservada, mantinha quatro colunas ao longo do muro norte e o piso de pedras artisticamente talhadas. Além de surpresos pelo bom estado da construção, Ben-David e Maoz entusiasmaram-se com algumas de suas singularidades. Por exemplo, a escada para o saguão principal e sua construção, voltada ao Oriente. A maioria das sinagogas do Golã e da Galiléia aponta para o sul, em direção a Jerusalém. A bimá, por sua vez, ergue-se ao longo do muro sul do edifício. Em artigo publicado no Haaretz, em 2003, Ben-David dizia que a estrutura da sinagoga de Dir Aziz era muito parecida com as construídas na região sul de Hebron, o mesmo acontecendo com o local do Aron Hakodesh. Mas a maior surpresa dos pesquisadores foi depararem-se com um pequeno jarro de barro, sob o piso da sinagoga, contendo catorze moedas de ouro do reinado do imperador Justiniano, de Bizâncio. “Sabíamos que, na época, era costume enterrarem-se moedas, mas, quase sempre, as de bronze. Os achados de Dir Aziz constituem um verdadeiro tesouro”. Ao longo das escavações, foram-se sucedendo as surpresas. Quando desmontaram um muro divisório construído no vilarejo durante o período sírio, encontraram uma inscrição em grego em uma pedra antiga, reutilizada, do período bizantino. Havia apenas uma palavra: “Azizo”. Sobre a palavra, os arqueólogos observam que havia na região de Hebron um povoado chamado Kfar Aziz. Há, também, outras explicações para a semelhança entre os termos Azizo e Aziz – ambos usados como prenomes entre os semitas. É possível que os fundadores da sinagoga tenham gravado o nome do doador da obra. Apesar das escavações não terem sido ainda encerradas, os estudiosos acreditam que a sinagoga foi utilizada até o início do domínio islâmico, durante as dinastias omíada e abássida. Durante o período romano, a região denominada Golã incluía principalmente a parte central do planalto, entre Nahal Jalabun, ao norte, e Nahal Kanaf, ao sul. Aí floresceram os povoados judaicos. O atual “sul do Golã” era genericamente descrito como Hippos, provavelmente pela influência grega dominante. Ao redor da cidade foram construídos também alguns vilarejos judaicos. Na literatura rabínica é também conhecida como Susita. Se durante a dominação romana os judeus se dedicavam quase que exclusivamente ao cultivo de vinhedos, com o domínio bizantino e seu contínuo deslocamento para áreas mais distantes e menos férteis passaram a produzir azeite de olivas. Segundo Ben-David, restos de prensas encontrados na região comprovam a florescente indústria desenvolvida pelos judeus, que chegavam a exportar a produção. Todo povoado construído no período bizantino possuía sua sinagoga, tendo-se provas da existência de no mínimo 25, em comunidades vizinhas. Para o arqueólogo, há uma relação inegável entre o êxito na indústria de azeite do povoado e o porte de sua sinagoga. Quanto mais bem sucedida a comunidade, mais monumental a construção. Tal pujança, no entanto, desapareceu no início da Idade Média. Foram abandonados todos os assentamentos da região central do Golã, inclusive os ishuvim judaicos. A localização exata de locais como Nov, Hispin, Afik e Kfar Haruv – mencionados em fontes históricas e na literatura rabínica – se perdeu. Para Ben-David, no entanto, Dir Aziz pode-se vangloriar de ser o único povoado do Golã onde se encontrou uma evidência de seu nome hebraico, preservada por mais de vinte séculos. Inúmeras atrações Palco de tantos eventos da história antiga, a região norte do Golã traz, em sua paisagem, marcas de vários períodos. Entre as colinas foi construída Ka’alat Namrud, uma das melhor preservadas fortalezas mamelucas, do período dos cruzados. De suas muralhas é possível se ter uma visão panorâmica das Cachoeiras de Banias, recanto dos mais procurados pelos israelenses que fogem das altas temperaturas que assolam o país, no verão. O vilarejo de Ein Kinya, por sua vez, permite aos visitantes aprender um pouco sobre o estilo de vida e a cultura drusa. A capital do Golã é Katzrin, cidade com várias opções turísticas. Com mais de 5 mil habitantes, situa-se entre os rios Zavitan e Meshushim. O Museu Arqueológico do Golã é parada obrigatória para os visitantes. Abriga uma coleção de artefatos que é uma verdadeira retrospectiva da história do homem e da cultura na região, dos tempos pré-históricos até o período talmúdico. Nesse museu estão expostos, entre outros, armas usadas nos embates entre os habitantes de Gamla e as legiões romanas. O próximo passo do roteiro dos visitantes é o antigo Parque de Katzrin, nas proximidades da zona industrial da cidade. Lá se vêem reconstituições de construções do período talmúdico, inclusive a magnífica sinagoga e duas residências. Ainda na zona industrial estão as vinícolas, que hoje fazem a fama dos vinhos israelenses, no mundo, com uvas cultivadas nos vinhedos locais. Algumas horas de visita bastam para provar que se está no coração dos famosos Vinhos do Golã. Sua região central se caracteriza pela presença de cachoeiras e rios que se estendem por quase toda a área – uma paisagem bem diferente do semi-árido que marca o sul de Israel. O verde é uma constante mais ao sul do Golã, no inverno e na primavera. De lá se tem uma vista panorâmica do lago Kineret, também chamado do Mar da Galiléia. Em suas águas, é muito refrescante um mergulho, no verão. Na área corre o Nahal El-Al, o mais perene dos rios do Golã, com duas famosas quedas de água – a Cachoeira Negra, cujas águas correm sob rochas negras de basalto; e a Cachoeira Branca, que deságua em um solo de calcário. Ainda na área, não importa a época do ano, é sempre bom passear pela região termal de Hammat Gader, famosa por suas propriedades luxuosas, da primeira fase do período romano. Outro ponto obrigatório é a cidade greco-romana de Susita, com igrejas bizantinas e ruas de colunas monumentais. Também conhecida como Ba’al Hermom, Mt. Líbano, Jabel A-talg, ‘Arqub, Hermon Massif, Pistas de Hermon, Jebel esh-Sheikh, Senir, Shenir, Sion, Sirion A ligação entre o povo judeu e as Colinas do Golã remonta aos tempos bíblicos. Diz a tradição judaica que foi no Monte Havtarim, na região do Monte Hermon, a 1.296m acima do nível do mar, nos declives de Katef Sion, que D’us prometeu a Abrão que lhe daria a terra para seus descendentes. Um antigo túmulo marca o local e um robusto carvalho ergue-se, ao lado. “Os olhos de Israel”. Assim é carinhosamente chamado o Monte Hermon, ponto culminante do país, localizado no topo da Cordilheira do mesmo nome, entre a fronteira de Israel e a Síria. Assim denominado por causa de seus picos, é um dos principais centros de prática dos desportos de inverno. Com 2.224m, foi o local escolhido para a implantação de um centro de lazer para turistas e amantes do esqui, pois a neve faz parte da paisagem natural da área de novembro a março, coberto de branco os picos do Hermon. Das suas encostas, que degelam depois do inverno, nasce o rio Jordão Vista de Hazor Mt. Hermon é o extremo sul da cordilheira Anti-Líbano. Seu pico mais elevado é 9230 pés e o ponto mais alto dentro das fronteiras de Israel hoje é Mizpe Shelagim em 7295 pés. A montanha é o único lugar com esqui na neve no país. Fronteira com a Síria A montanha tem sido conhecida como Ba’al Hermom, Senir, Sirion, Sião, e por Josefo como Mt. Líbano. Hoje, os árabes chamam de “Jabel A-talg” que se traduz como “a montanha de neve.” Mais de vinte templos antigos foram encontrados na montanha ou na sua proximidade. Mt. Hérmom Sl 133:3 (NVI) “É como se o orvalho de Hérmon estavam caindo sobre o monte Sião”. Cântico dos Cânticos 4:8 (NIV) “Vem comigo do Líbano, minha noiva …. descer do cume do Amana, do alto de Senir, o cume do Hermon, das cavernas dos leões e das principais atracções da montanha dos leopardos . “ Bibliografia: Duby, Tal & Haramati, Moni. Golan. Skyline , Ministry of Defense Publishing House,2001 Ya’acov Shkolnik, “Secrets from the Golan’s Ancient Synagogues”, The Book – 1985-2005. A selection of articles from ERETZ Magazine