abril 22, 2022

MAÇONARIA E SECULARISMO - Jean-Philippe Hubsch. Adaptado de tradução feita por José Filardo


O secularismo é um conjunto de princípios legais baseados no primado da liberdade de consciência; não é uma arma contra as religiões, nem uma religião civil. A universalidade da lei comum não deve referir-se a nenhuma das várias religiões para se impor a todos os cidadãos. Uma loja maçónica é um lugar de aceitação da diferença, de pacificação de intercâmbios. Isto porque a Maçonaria considera que o secularismo é um princípio universal de pacificação social.

A oportunidade que nos é oferecida de questionar aqui as ligações entre a Maçonaria e o secularismo é particularmente bem-vinda.

Princípio emblemático da tradição republicana francesa, sacralizado pela Terceira República e considerado “intangível” até 1940, o secularismo é hoje o lugar de um profundo esquecimento e, no momento em que ele é perigosamente desafiado pelos “fanatismos” e intolerâncias, sejam eles culturais, políticos, económicos, religiosos, raciais, não é mais propriamente defendido e a pior das confusões reina em torno da noção…

Às vezes, o secularismo é confiscado a favor de um projeto identitário e usado como uma arma contra o Islão. Outras vezes, e ao contrário, pode dizer-se, ele é reduzido a um simples princípio de tolerância a serviço de um projeto multicultural de organização de designações identitárias. Ele é também apresentado como uma espécie de religião civil – aquela daqueles que não teriam nenhuma religião – quando não é visto como uma mera máquina de guerra contra convicções e sentimentos religiosos!… Cada um à sua maneira, todos estes discursos constituem tantas desnaturações do secularismo republicano.

É verdade que no nosso país a Maçonaria é sempre associada ao secularismo. Com as suas tomadas de posição vigilantes a cada suposta ameaça, ela seria até vista – sem trocadilho – como “guardiã do templo”! …

A inspiração das lojas

Desde os seus primeiros passos, a moderna Maçonaria desenvolve um pensamento universalista.  As Constituições de Anderson – o seu texto fundador – anunciam que ela se pretende tornar o “Centro da União, [permitindo] uma amizade sincera entre pessoas que poderiam ter permanecido a uma distância perpétua”, seja por razões políticas, religiosas ou nacionais.

A loja que trabalha neste “centro da união” é uma comunidade que implementa uma “fraternidade eletiva” em busca do pluralismo social, político e religioso. Ela só pode existir e durar porque é soldada por rituais rigorosos e eficazes.

A Loja Maçónica em trabalho é também um método, uma disciplina que contraria toda a espontaneidade e se opõe a todas as inclinações naturais, para realizar uma mudança de estrutura mental para assegurar a superação de intercâmbios interpessoais em benefício da unidade da loja. É uma contracultura tradicional na qual os Maçons, protegidos pelo segredo dos seus intercâmbios, se tornam tantos “contrabandistas” heterodoxos.

O que esta contracultura propõe é, antes de tudo, o trabalho sobre si mesmo – os Maçons falam do seu “templo interior” que torna possível encontrar a unidade interior, reconciliar-se consigo mesmo, a condição primeira para poder para realmente abrir para os outros que eles aprenderam a ver como irmãos e, ao fazê-lo, trabalhar para a melhoria da humanidade – no “templo da humanidade” – Esta contracultura afirma-se como um continuidade espiritual, uma tomada de consciência da solidariedade universal.

Ela é o lugar de uma certa igualdade, marca de tolerância e de abertura. Em loja, aceitar a diferença do outro, aceitar a sua palavra e a respeitar é, para todo Maçom, um requisito absoluto. Mas a tomada em consideração desta alteridade é feita no âmbito de referências comuns que não podem ser transgredidas.

Com as suas ferramentas tradicionais de pacificação progressiva das relações, a Maçonaria é, portanto, uma espécie de laboratório de sociedade, laboratório do laço social que faz germinar naturalmente o princípio do secularismo.

Embora supervisionadas de perto, as lojas maçónicas foram, na sociedade política muito fechada do século XIX francês, as únicas associações ativas toleradas e, portanto, naturalmente, os lares subterrâneos do essencial da vida intelectual e política do país. É por isto que, desde a capitulação de Sedan, a República surgirá toda armada de lojas. Léon Gambetta, e todos os Jules, Simon, Grévy, Favre e especialmente Ferry, para citar apenas estas eminentes personalidades da primeira geração republicana, todos vieram diretamente das lojas.

A construção republicana do secularismo

A República tem por ambição uma construção permanente do laço cívico além das designações identitárias de cada um, na busca e preservação do que é comum a todos. No final do século XIX e início do século XX, a Maçonaria será participará verdadeiramente dos combates políticos para a construção do secularismo do Estado e as concepções que ela defenderá não serão diferentes daquelas que a República se vai dedicar a implementar.

O secularismo é um conjunto de princípios jurídicos baseados no primado da liberdade de consciência. A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 26 de Agosto de 1789, tem a religião por uma “opinião” como qualquer outra (Artigo 1.0), que surge, portanto, exclusivamente da liberdade de cada um. Isto necessariamente decorre da igualdade de todas estas opções espirituais aos olhos da lei e, portanto, a igualdade de todos os cidadãos, independentemente das suas opiniões ou religião. A universalidade da lei comum que não se deve referir a nenhuma das diferentes religiões para se impor ao conjunto dos cidadãos é indispensável.

O secularismo torna-se, assim, um princípio de organização social.  O poder público e a esfera a ele associada, com vistas a constituir, estabelecer e garantir os direitos e liberdades que beneficiarão a universalidade dos cidadãos, deve estar sujeitos a uma reserva absoluta em matéria de opções espirituais.

A esfera privada é a dos indivíduos e das comunidades, livre no respeito a lei.  Cada cidadão devem poder exercer estas liberdades individuais e privadas, que são as liberdades de consciência, de opinião religiosa ou outras – e da expressão, fora do domicilio privado, ao nível do espaço civil aberto a todos, no respeito ao direito comum e à ordem pública.

Ao mesmo tempo, o Estado garante a independência destas duas esferas e da unidade da comunidade política dos cidadãos em torno de valores comuns compartilhados.

Numa sociedade secular, o reconhecimento do direito de cada um construir e expressar a sua diferença é, portanto, sempre concebida num espaço de relacionamento, confronto e diálogo com os outros. Este comportamento representa, obviamente, um ideal difícil de construir e alcançar, que produziu no nosso país um modo de vida que é objeto de um consenso duradouro.

Ninguém precisa conhecer as escolhas filosóficas ou religiosas uns dos outros, elas pertencem-lhes. Ninguém precisa de as conhecer, especialmente o Estado, que se proíbe de os recensear. Aqui, novamente, a religião é entendida como uma escolha individual, uma opinião – que se pode mudar – e não como um pertencimento. O culto público, que é legítimo, é praticado em lugares que lhe são normalmente reservados  e isto traduz-se no nosso país pelo surgir gradual de uma cultura compartilhada da discrição das expressões religiosas na sociedade civil.

É a própria essência da tradição histórica e jurídica francesa que vê nessa discrição compartilhada a melhor maneira de garantir que todos tenham a oportunidade de viver juntos numa convivência serena e pacífica, baseada no respeito aos diferentes pensamentos.

Fundamentalmente, se o secularismo francês respeita todas as opções espirituais, é antes de tudo na medida em que elas são expressões da liberdade de consciência dos cidadãos. Assim, a República estará, sem dúvida, menos preocupada expressamente com o indivíduo cuja afiliação a uma comunidade é adquirida do que com o ateu, o agnóstico ou o crente individualista que rompe com o seu grupo, porque eles estão sozinhos e a sua liberdade precisa da protecção do Estado, que também deve ser capaz de proteger o direito de acreditar e de blasfemar.

Os desafios do presente

A construção republicana define-se pelo seu carácter universalista, do qual o secularismo é uma ferramenta essencial. Atualmente, assistimos a um ressurgir de manifestações de afirmação identitária inspiradas na religião, mas que vão muito além das questões de culto, desafiando abertamente o secularismo e os princípios republicanos. E também observamos que a liberdade de consciência e a igualdade de todos recuam e não são mais garantidas em certos espaços privados.

No exato momento em que, portanto, parece que o nosso secularismo constitucional devia, sem dúvida, ser exercido, além dos serviços públicos, na proteção do espaço social, “um lugar de compartilhamento sob o olhar dos outros”, em face de demandas urgentes de expressão religiosa, percebemos que o secularismo perdeu muito da sua força simbólica. O Estado republicano tem o dever de se envolver na defesa de projetos universalistas diante  ataques comunitaristas de certos grupos de pressão.

Como as lojas sabem fazer, a República deve esforçar-se para criar públicos comuns.  Ela deve saber lutar contra as discriminações com base na igualdade, apresentando o que é comum aos indivíduos e grupos sociais, e não através do reconhecimento identitário, que se fechará como uma armadilha implacável sobre o cidadão e os seus direitos.

Um estado neutro, sensível apenas à liberdade do cidadão individual é um modelo moderno e portador de progresso para o futuro. O seu instrumento fundamental é o secularismo, que por si só é capaz de impregnar um pensamento universalista da diversidade, livre da vulgata culturalista que atualmente se está a espalhar sem restrições alguma no debate político e na Comunicação Social. Ela aparecerá então como um princípio universal de pacificação social.



abril 21, 2022

TIRADENTES, HERÓI e HISTÓRIA - Newton Agrella



Newton Agrella é escritor, tradutor e palestrante. Considerado um dos maiores intelectuais da maçonaria no país.

Eleger e reverenciar heróis faz parte da cultura de cada povo.

Trata-se de uma espécie de valorização da própria natureza humana e da identidade de cada sociedade.

Ao herói se lhe é dado um salvo-conduto, como instrumento de representatividade de um povo.

Como não poderia ser diferente, nós brasileiros, também elegemos nossos heróis.

Há aqueles que dizem respeito notadamente aos ideais de Liberdade e Soberania, como é o caso de Tiradentes, cuja consagração ao status de mártir, faz com que do ponto de vista histórico-social, seja aquele que melhor se identifique com as aspirações e  com o sentimento de orgulho de nosso povo. 

A data de 21 de Abril de 1792 que diz respeito à sua morte por enforcamento, que o diga.

Ainda que marcada por traços obscuros de sua trajetória de vida, bem como das interpretações imprecisas que historiadores conferem a ele, e que se explicam em função das  inevitáveis distorções que a transmissão oral dos fatos e a carência de registros documentais produzem, não há contudo, como desvirtuar a relevância de seu papel no tocante à Inconfidência Mineira, em que seu protagonismo foi inquestionável num dos episódios embrionários na luta pela independência do Brasil em relação à coroa portuguesa.

A data de 21 Abril parece até, que ganhou um certo estigma, fruto inclusive da própria mídia nacional, que na História mais recente de nosso país, registrou  a morte do então eleito presidente, Tancredo Neves, que tomado por uma grave doença não conseguiu ser empossado e assumir a presidência da República, provocando uma verdadeira comoção nacional.

Cabe lembrar, que sua figura dócil, paternal e conciliadora contribuíram de forma inequívoca para que o mesmo fosse igualmente alçado à condição de herói.

E assim a História vai sendo contada, com requintes de beleza, sofrimento, amor e ódio, de tal sorte, que o que permanece na mente das pessoas, é o que o imaginário registra e guarda na memória.

Aliás, para um povo que habitualmente tropeça em sua própria memória histórica, nada melhor do que preservar seus heróis, inobstante algumas inconsistências que possam haver em todo esse processo.


VINTE E UM DE ABRIL - Adilson Zotovici



Adilson Zotovici  poeta e intelectual, da Confraria Maçons em Reflexão e da ARLS Chequer Nachif de S. Bernardo do Campo


Sem se conter, por Liberdade, 

Conjuração com pertinência 

A defender sua propriedade 

Com obstinação, resistência


Inflama a arbitrariedade, 

A exploração, a truculência  

E clama a sociedade 

Contra a Derrama, inclemência  


Homens da fraternidade 

Quiseram igualdade, decência, 

Para si e à posteridade 

Tiveram a intransigência 


E a traição persuade  

À punição em essência !

Contra o Alferes...atrocidade

Degredo a outros em sequência


Travos de insídia, ambiguidade 

Timbravam de Inconfidência

Aos bravos heróis, que em verdade, 

Ansiavam a Independência ! 



abril 20, 2022

QUEM FOI ALBERT MACKEY? -


Alguns autores e obras são citados constantemente na maioria dos livros pela sua importância cronológica e, mais ainda, pela contribuição imprescindível que deram para a organização da nossa instituição. Poderíamos mencionar os trabalhos eternos de Joseph Paul Oswald Wirth, Robert Freke Gould, George Kloss, William Hutchinson, René Guénon,Wilhelm Begemann, Eliphas Levy, Alec Mellor e tantos outros não menos importantes. Trataremos aqui, de maneira breve, da obra de Albert Gallatin Mackey, possivelmente, o mais citado de todos os autores, facto este que se deve a especificamente um dos seus legados.

O americano Albert Gallatin Mackey talvez tenha sido o mais importante historiador e jurista maçónico que aquela nação já produziu. Segundo os seus próprios compatriotas, até hoje não se avaliou adequadamente as consequências que os seus trabalhos tiveram sobre a maçonaria, não só americana, mas também de todo o mundo.

Dos Irmãos Americanos que conquistaram fama internacional no mundo maçónico, vários foram escritores cujos trabalhos ajudaram na formação e na extensão da luz maçónica, dentre estes nenhum escreveu tão volumosamente como o fez Mackey.

Nascido em 12 de Março de 1807 na cidade de Charleston no estado americano da Carolina do Sul, Albert Mackey graduou-se com honras na faculdade de medicina daquela cidade em 1834. Praticou a sua profissão durante vinte anos, após o que dedicou quase por completo a sua vida à obra maçónica.

Recebeu o grau 33, o último grau do Rito Escocês Antigo e Aceite, e tornou-se membro do Supremo Conselho onde serviu como Secretário-geral durante anos. Foi nesta época que ele manteve uma estreita associação com outro famoso Maçon americano, Albert Pike.

Participou como membro ativo de muitas lojas, inclusive a lendária “Solomon’s Lodge nº 1”, fundada em 1734, que é, ainda hoje, a mais famosa e mais antiga loja operando continuamente na América do Norte. Ocupou inúmeros cargos de destaque nos mais altos postos da hierarquia maçónica do seu país.

Pessoalmente o Dr. Mackey foi considerado encantador por um círculo grande de amigos íntimos. O seu comportamento representava bem o que, entre os americanos, é chamado de cortesia sulista. Sempre que se interessava por um assunto era muito animado na sua discussão, até mesmo eloquente. Generoso, honesto, leal, sincero, ele mereceu bem os elogios e qualificações que recebeu de inúmeros maçons de destaque.

Um revisor da obra de Mackey disse que, como autor de literatura e ciência maçónica, ele trabalhou mais que qualquer outro na América ou na Europa. Em 1845 ele publicou o seu primeiro trabalho, intitulado Um Léxico de Maçonaria, depois disto seguiram-se:

“The True Mystic Tie” 1851;

The Ahiman Rezon of South Carolina,1852;

Principles of Masonic Law, 1856;

Book of the Chapter, 1858;

TextBook of Masonic Jurisprudence, 1859;

History of Freemasonry in South Carolina, 1861;

Manual of the Lodge, 1862;

Cryptic Masonry, 1867;

Symbolism of Freemasonry, and Masonic Ritual, 1869;

Encyclopedia of Freemasonry, 1874;

Masonic Parliamentary Law 1875.

Mackey esteve até o fim da vida envolvido com a produção de conhecimento maçónico. Além dos livros citados ele contribuiu com frequência para diversos periódicos e também foi editor de alguns. Por fim, publicou uma monumental “History of Freemasonry”, que possui sete volumes. Um testemunho da importância e popularidade que os livros escritos por Mackey têm é o facto de que muitos deles são editados até hoje e estão à venda em livrarias, inclusive pela Internet. No site da livraria Amazon, tida como a maior da Internet, é possível adquirir 26 edições diferentes quando se procura livros usando como referência as palavras Albert Mackey. Para quem tem habilidade de leitura em inglês, é possível ler um livro inteiro de Mackey disponível na internet. O título “Symbolism of Freemasonry” ou o Simbolismo na Maçonaria, de 364 páginas.

Dos muitos trabalhos que o Dr. Mackey legou à posteridade, um julgamento quase universal identifica a “Encyclopedia of Freemasonry” como a obra de maior importância. Anteriormente à publicação deste livro não havia nenhum de igual teor e extensão em qualquer parte do mundo. Esta obra teve muitas edições e foi revista várias vezes por outros autores maçónicos.

A contribuição de Mackey para o pensamento e leis maçónicas, produto da sua mente clara e precisa, é tida como de fundamental importância. Praticamente toda a legislação maçónica fundamental é hoje interpretada com base em alguns dos seus escritos. É verdade que algumas das suas obras contêm enganos, mas o conjunto é de extremo valor e, em particular, um trabalho tem especial destaque no mundo todo. A compilação feita por ele dos marcos ou referenciais básicos da maçonaria é adoptada como fundamento em vários ritos e obediências. Estamos a falar dos tão mencionados e conhecidos “Landmarks”.

A primeira vez em que se fez menção à palavra Landmark em Maçonaria foi nos Regulamentos Gerais compilados em 1720 por George Payne, durante o seu segundo mandato como Grão-Mestre da Grande Loja de Londres, e adoptados em 1721, como lei orgânica e terceira parte integrante das Constituições dos Maçons Livres, a conhecida Constituição de Anderson, que, na sua prescrição 39, estabelecia assim:

“XXXIX – Cada Grande Loja anual tem inerente poder e autoridade para modificar este Regulamento ou redigir um novo em benefício desta Fraternidade, contanto que sejam mantidos invariáveis os antigos Landmarks…”

A tradução da palavra Landmark do inglês para o português resulta no substantivo “marco”, que, caso consultemos o dicionário Aurélio, tem o seguinte significado: marco [De marca.] S. m. 1. Sinal de demarcação, ordinariamente de pedra ou de granito oblongo, que se põe nos limites territoriais. [Cf. baliza (1).] 2. Coluna, pirâmide, cilindro, etc., de granito ou mármore, para assinalar um local ou acontecimento: o marco da fundação da cidade. 3. Qualquer acidente natural que se aproveita para sinal de demarcação. 4. Fig. Fronteira, limite: os marcos do conhecimento.

Estas definições exemplificam bem o contexto no qual o termo Landmark é utilizado, além de fazer uma referência quase explícita às origens operativas da maçonaria, quem já construiu algo em alvenaria sabe que a fixação dos marcos é um dos primeiros momentos da obra e um passo fundamental para a sua execução. Sem marcos bem estabelecidos fica muito difícil a obra ser bem executada.

Os Landmarks, que podem ser considerados uma “constituição maçónica não escrita”, longe de serem uma questão pacífica, constituem-se numa das mais controversas discussões da Maçonaria, um problema de difícil solução para a Maçonaria Especulativa. Há grandes divergências entre os estudiosos e pesquisadores maçónicos acerca das definições e nomenclatura dos Landmarks. Existem várias e várias classificações de Landmarks, cada uma com um número variado deles, que vai de 3 até 54. Virgilio A. Lasca, em “Princípios Fundamentales de la Orden e los Verdaderos Landmarks”, menciona uma relação de quinze compilações.

As Potências Maçónicas latino-americanas, via de regra, adoptam a classificação de vinte e cinco Landmarks compilada por Albert Gallatin Mackey. Deve-se a isto a frequência com que o Mackey é mencionado também entre nós.

Segundo estudiosos do assunto, a compilação de Mackey teve sucesso por que conseguiu ir ao passado e trazer as tradições e costumes imemoriais à prática maçónica moderna. Este trabalho estabeleceu a ordem no meio do caos, fornecendo um ponto de partida para os juristas e legisladores maçónicos que o seguiram.

Fato é que o grande trabalho de Mackey em jurisprudência, e mesmo o que se estende além dos Landmarks ou da jurisprudência, sobreviveu ao teste do tempo. Ainda hoje ele é frequentemente citado como uma autoridade final. As suas contribuições tiveram, e ainda tem, um efeito profundo e permeiam grande parte do pensamento maçónico moderno. Ao criar a sua obra, este autor, estava na realidade criando os marcos sobre os quais foi possível edificar grande parte do conhecimento maçónico que se produziu posteriormente.

Albert Gallatin Mackey passou ao oriente eterno em Fortress Monroe, Virgínia, em 20 de Junho de 1881, aos 74 anos. Foi enterrado em Washington em 26 de Junho, tendo recebido as mais altas honras por parte de diversos Ritos e Ordens. Hoje existe nos Estados Unidos uma condecoração, a “Albert Gallatin Mackey Medal” , que é a mais alta condecoração concedida a alguém que muito tenha contribuído para a causa maçónica.

Adaptado de Autor desconhecido

Bibliografia:

Este trabalho foi elaborado tendo como base a bibliografia listada abaixo, sendo que dela foram retirados as ideias centrais, referências e inclusive transcrições literais.

Publicação da Aug∴ Resp∴ Loj∴ Simb∴ São Paulo n° 43.

Publicação da Gran∴ Loj∴ Maç∴ do Estado da Paraíba.

The Grand Lodge of Free and Accepted Masons of the State of California.

Fonte: Freemason.

DAS COISAS INANIMADAS - Heitor Rodrigues Freire


Heitor Rodrigues Freire,  Corretor de imóveis e advogado é past GM da GLEMS e atual presidente da Santa Casa de Campo Grande, MS,


Nós vivemos imersos em um mundo cheio de pessoas, coisas, cheiros, sons, movimento e gostos e, envolvidos pelos nossos sentimentos, desejos, objetivos e projetos, poucas vezes nos damos conta da realidade que nos circunda.

Como nosso foco é sempre voltado para o que nos interessa no momento, deixamos de perceber um universo de energias e de situações que nos cercam e que são muito importantes, para as quais não damos a menor importância, de um modo geral.

Refiro-me às coisas inanimadas. Inanimadas? Por quê? Porque não têm movimento aparente? Existe algo no universo que permaneça inerte? Inanimado? Objeto que não tenha alma, que não tenha vida?

No meu entendimento tudo está conectado. Não há nada fora da vibração divina. Assim, tudo vibra, tudo tem vida, tudo tem energia e como tal, tudo tem uma espécie de consciência. É indispensável que tenhamos respeito por tudo que nos cerca. E que procuremos entender a função das coisas inanimadas para que possamos vibrar juntamente com elas e nos beneficiarmos disso.

Dentre os princípios herméticos, que são sete, codificados por Hermes Trismegisto, rei, sacerdote e juiz no Egito Antigo, o princípio de vibração é o terceiro: “Nada está parado, tudo se move, tudo vibra”. Nada neste mundo está em repouso, tudo está em constante movimento. Tudo tem a sua infinita vibração, embora algumas coisas pareçam estar em repouso, na verdade estão dentro de um universo que não para de vibrar.  

Um acontecimento bíblico, mencionado por Michael Berg (acadêmico, professor, co-diretor do Kabbalah Centre), editor da primeira tradução do Zohar em inglês (Sefer ha-Zohar – o Livro do Esplendor – sem sombra de dúvida, a obra principal e mais sagrada da Cabalá, a dimensão mística do judaísmo), ilustra bem essa afirmação: Quando Moisés recebeu a incumbência de salvar seu povo, o primeiro ato foi o da transformação das águas do rio Nilo em sangue, e quem golpeou o Nilo com a vara de Moisés foi Aarão, seu irmão. Moisés não poderia fazê-lo porque estaria demonstrando ingratidão com o rio que o acolheu e protegeu. 

Isto porque, como se sabe, quando Moisés era bebê foi colocado numa cesta por sua mãe na correnteza do rio, para fugir do decreto faraônico que determinava que os varões nascidos da descendência judaica deveriam ser sacrificados. O Nilo o acolheu e lhe deu guarida até que fosse encontrado pela irmã do faraó, que o adotou. 

Segundo os judeus, todo o reino dos objetos inanimados está em constante comunicação com ele mesmo, assim como com todas as coisas vivas. Portanto, é tremendamente importante que nunca haja um momento em que desrespeitemos qualquer coisa no mundo inanimado. 

Podemos ler isto e pensar: “Que possíveis sentimentos pode ter o rio Nilo? Será que realmente os sentimentos do rio Nilo ficariam feridos se Moisés os golpeasse? Mas a verdade é que uma consciência muito importante está sendo revelada para nós aqui, consciência que também podemos ver no trabalho a cada Shabat”.

A consciência de Moisés com relação ao rio Nilo, portanto, desperta em nós o entendimento de que há consciência em tudo no nosso mundo. Todos os objetos — animados e inanimados — estão interligados através de uma rede de energia e luz. Não foram só as águas do Nilo que salvaram Moisés quando ele estava flutuando rio abaixo, ainda bebê; foram também a energia e a luz que existem dentro do Nilo que o salvaram.

Precisamos da ajuda de tudo, inclusive das coisas inanimadas. E o Zohar diz que, assim como nossas paredes pensam em nós, assim também o fazem nossas roupas e todas as outras coisas. Esses objetos inanimados podem nos amparar, por isso não devemos fazer-lhes nenhum mal. A maioria de nós, no entanto, nem sequer está ciente de como os objetos inanimados são necessários para o nosso próprio desenvolvimento e crescimento espiritual.

Como é complexo e fascinante o mundo em que vivemos. E como é importante procurar conhecê-lo, reconhecê-lo e considerá-lo para que possamos interagir com ele e assim vivermos com consciência e alegria.

Heitor Rodrigues Freire – Corretor de imóveis e advogado

abril 18, 2022

A MAÇONARIA NA HISTÓRIA - Demerval Mattos Júnior


A maçonaria é uma instituição que teve origem nas antigas corporações de mestres pedreiros, construtores de igrejas e catedrais, que sob a sombra dos religiosos, erigiam as diversas edificações para o mundo católico romano.

Inicialmente, o trabalho era executado apenas pelos religiosos, que, além de arquitetos levantavam os edifícios com as próprias mãos. Os leigos foram aceitos lentamente quando se reconheceu que o trabalho honrava e era realizado por amor a Deus e à Igreja, mas afastava os monges de seus deveres religiosos e intelectuais.

CONSTRUTORES DE CATEDRAIS

Tudo aconteceu quando a ciência da construção foi revivida pelos padres do mosteiro de Cluny da ordem de São Bento numa época em que a Europa encontrava-se devastada pelas invasões bárbaras. Esse mosteiro, construído no século X, em 911, tornou-se o mais importante centro de conhecimento e cultura para onde se dirigiam altos dignitários da Igreja em busca de aperfeiçoamento e entendimento.

As construções de Cluny serviram de modelo para toda Europa. Seus arquitetos e mestres de obras permitiram a evolução da arte romântica para a arte gótica, marcando definitivamente seu gênio na beleza das grandes catedrais construídas nos séculos seguintes. As primeiras igrejas eram sem decorações e os cristãos ali se reuniam para orações e pregações, mas era também um ponto de encontro dos cidadãos e centro de reuniões onde discutiam assuntos da comunidade.

Em 1205, um sínodo reunido em Arras, permitiu a gravação de momentos bíblicos nas paredes dos santuários. Por meio de pinturas, gravações na pedra e esculturas, o artesão ganhou a oportunidade de criar e exercer sua arte em uma linguagem direta dos olhos para o coração. Foi o escritor francês Victor Hugo que chamou essas catedrais de Maravilhosos Livros de Pedra, onde os "simples", como eram chamados os homens do povo, analfabetos e arraigados na sua fé, conseguiam "ler" a expressão maior de sua crença nas imagens, altares, altos e baixos relevos, vitrais e símbolos das fachadas. Fulcanelli escreveu que a catedral "é o asilo inviolável das pessoas perseguidas e o sepulcro dos mortos ilustres. É a cidade dentro da cidade, o núcleo intelectual e moral do aglomerado, o coração da atividade pública a apoteose do pensamento, do saber e da arte".

Foi o pedreiro, aquele artesão que dentro de sua confraria como aprendiz havia aprendido a trabalhar a pedra lavrada, que construiu as grandes obras, erigindo edifícios e torres de altura até então inimagináveis. Associados a marceneiros, vidraceiros, canteiros e religiosos, os pedreiros criaram as maravilhas das igrejas góticas espalhadas pela Europa.

O MAÇOM OPERATIVO

Esse pedreiro, talhador de pedra ou free-maçom - conhecido por maçom operativo porque exercia na pedra a sua arte de construtor - é o antecessor do maçom moderno, especulativo, que surgiu oficialmente em 1717 e cujos preceitos fundamentais persistem até os dias de hoje.

O maçom medieval era como o homem de sua época, extremamente religioso, ligado à Igreja, obediente a seus mandamentos e doutrina, mas distinguia-se pela liberdade de locomoção através do continente em busca de trabalho nas construções de igrejas, abadias, mosteiros, castelos pontes e fortificações, o que não era permitido ao homem do povo, o servo, proibido de circular fora das terras do senhor feudal.

A liberdade de ir e vir, além de sinal de prestigio na sociedade em que vivia, trazia um nível de satisfação pessoal intensa que possibilitava na criatividade de seu trabalho repercutir a alegria de ser um homem livre. Ele trabalhava com a comunidade conhecia seus problemas e necessidades, e expressava em suas paredes as imagens de seu tempo.

O trabalho e a arte de construir uma grande igreja ou catedral era lento, por vezes ultrapassando séculos, interrompido por guerras, invasões, incêndios, falta de recursos, mudança de governantes, epidemias ou outras agruras que faziam reais os ditos da oração "a vós bradamos os degradados filhos de Eva, a vós suplicamos gemendo e chorando neste vale de lágrimas". Passado o problema e mais motivado em sua fé o povo da cidade, seus bispos, senhores feudais, reis e principes, ajudavam, patrocinavam e empregavam recursos no intuito de melhorar a renda da cidade e o comércio local. Eram contratados mestres construtores, com os quais concluíam-se contratos minuciosos discriminando deveres e obrigações de cada parte. Tais documentos encontram-se hoje à disposição de estudiosos com dados e solicitações que expõem a vida daqueles homens.  

O maçom operativo fazia parte de uma corporação, na qual exercia a função de aprendiz ou companheiro. O local das reuniões era chamado de Loja e funcionava tanto como ponto de encontro quanto de local de repouso. Nas Lojas eram guardados os instrumentos de trabalho, planos, desenhos e plantas. O acesso era vedado aos que não pertencessem à corporação. Em geral, as Lojas eram situadas junto ao canteiro de obras. Ali se discutiam e planejavam as tarefas do dia. Assim como em outras corporações, os maçons guardavam em segredo sua arte, pois trabalhar com pedras e erguer paredes firmes, abrir janelas e espaços exigia conhecimento e técnica, já que desmoronamentos e acidentes poderiam ser fatais em caso de erro.

Iniciavam o dia com atos de devoção. O mestre instruía sobre as tarefas; os companheiros cinzelavam as pedras, erguiam paredes, arcos e flechas das igrejas; os aprendizes lidavam com a argamassa e traziam as ferramentas. O pagamento era estabelecido a partir de contratos feitos com os habitantes da cidade, os quais previam também a construção da loja e o fornecimento de aventais e luvas para as necessidades do oficio. Raramente eram pagos em dinheiro mas em trigo, pão, cerveja e tecidos. Assim trabalharam durante séculos, conservando o monopólio das construções por meio de segredo e juramento.

A Maçonaria na sua forma atual, a forma Especulativa, teve início no séc. XVIII através da fundação em 24 de junho de 1717 da Grande Loja de Londres, resultado da reunião de quatro Lojas dos chamados Maçons Aceitos. Mas em realidade a Maçonaria Especulativa é sucessora de uma associação ainda mais antiga, a Maçonaria Operativa, que em suas origens retorna à Idade Média.  

Em meio à estabilização política do século X, as pessoas que até então se preocupavam somente em se proteger das invasões de bárbaros,  voltaram a se preocupar com os assuntos da fé e também a construir obras de melhor qualidade, utilizando a pedra em substituição à madeira.  

Esse ressurgimento religioso resultou na construção em grande escala de Igrejas, catedrais e abadias. Somente na Inglaterra do séc. XI foram construídas 5.000 igrejas, havendo a imperiosa necessidade de recuperar as técnicas de construção em pedra, há muito não utilizadas. Nessa época ressurge o trabalhador especializado na arte de construção com pedra, chamado de "Talhador de Pedra", ou Freemason ou Maçom Operativo.

O trabalho dos talhadores de pedra era realizado em varandas cobertas de palha ou telhas, chamadas de "Lodge" ou abrigo em português, traduzidos na Maçonaria para "Lojas", onde trabalhava, comia, repousava e discutia os problemas da obra. Naturalmente se formava uma corporação profissional que, por conta do caráter religioso da época, também resultou em uma confraria religiosa.

Mais adiante em 1364, o governo da Inglaterra obrigou a todos os tipos de operários a se organizarem em companhias de ofício. Os Maçons Operativos se reuniram então em uma das 91 companhias formadas na cidade de Londres. Ao mesmo tempo, o estilo de construção de igrejas havia mudado, abandonando-se o complicado estilo gótico por um estilo mais simples da Renascença. 

Aos poucos os Maçons Operativos foram perdendo seus clientes e sua força, entrando a seguir em franca decadência. A partir de século XVI as Confrarias, sob o risco de desaparecimento, abriram suas portas para os Maçons Aceitos, pessoas que podiam ajudar na manutenção da Fraternidade, mas que não tinham nenhuma relação com ofício de construtor.

Aos poucos as Lojas Operativas desapareciam e as Fraternidades que aceitavam os Maçons Aceitos floresciam, até que em determinada época as últimas se separam das Lojas Operativas, contudo mantendo a tradição de mútuo socorro e proteção.

Finalmente em 1717, quatro Lojas Especulativas dos Maçons Aceitos se reuniram para formar a Grande Loja de Londres, que passou a se denominar Grande Loja da Inglaterra, quando se expandiu além dos território da cidade de Londres. Ao admitir pessoas de todas as religiões, nacionalidade, raças e partidos, a Maçonaria cresceu rapidamente, sendo que em 1723 já eram 30, 64 lojas em 1725 e 102 em 1732.

MAÇONARIA ESPECULATIVA

A ascensão da burguesia trouxe mudanças. As construções de menor porte, a descoberta de novas técnicas, o emprego de materiais mais simples e o abandono das construções de pedra possibilitaram que pessoas de fora da corporação pudessem exercer o oficio. Simultaneamente, após a Renascença, no século XVII, as universidades da Inglaterra começaram a formar arquitetos especializados em projetar e construir. Esses profissionais, porém, encontraram intensa dificuldade em trabalhar, uma vez que, por tradição, as edificações ainda eram confiadas aos membros das corporações, os free-maçons. Os universitários procuravam entrar nas confrarias. O maçom operativo, sentindo diminuir progressivamente as possibilidades de trabalho, começou a trazer para o interior das lojas indivíduos que, embora nunca houvessem exercido o ofício de pedreiro, traziam um conhecimento novo. Preocupados em não desaparecer como corporação e manter suas aspirações liberais, os maçons livres resolveram trazer para as lojas pessoas de destaque, que não exerciam o oficio, mas comungavam com suas idéias e eram capazes de reforçar as Lojas.

Inicialmente, deram a esses homens a denominação de patronos, logo substituída por maçons aceitos. Dessa forma, a fraternidade de maçons livres e aceitos ganhou força e poder. Esse novo maçom é chamado de Especulativo (de especular: examinar com atenção, averiguar, observar, indagar, pesquisar). Ele traz para a corporação o ideário do iluminismo e a influência Rosacruz. Surgia o que os historiadores passaram a chamar de maçonaria especulativa (filosófica). Rapidamente os mais letrados passaram a predominar na corporação, mudando a orientação cultural, embora conservando os aspectos fundamentais da fraternidade, tais como: o sentimento de união, igualdade entre todos, liberdade e fraternidade, atributos que constituíam sua espinha dorsal. Além da organização ritualística, foi mantido todo o simbolismo básico, incluindo os aventais de pedreiro e os instrumentos de trabalho do maçom operativo (esquadro, compasso, fio de prumo, nível), bem como a parte secreta da corporação, constituída por sinais, toques e palavras de reconhecimento mútuos.

EXPANSÃO NA EUROPA

Fiéis a uma tradição de tolerância religiosa e liberdade, as lojas atuavam silenciosamente num continente em conflito. Recebiam e protegiam os perseguidos por sua crença ou aqueles envolvidos na luta contra o arbítrio dos poderosos. Em 1717, evoluindo e aumentando seus interesses sociais, quatro lojas – constituídas basicamente por maçons aceitos - reuniram-se em uma taberna de Londres. Ali foi criada a Grande Loja da Inglaterra, considerada a Loja mãe da maçonaria universal.

A expansão foi rápida, passando de quatro Lojas, em 1717, para 16 Lojas em 1721; 30 Lojas em 1723, até alcançar 102 Lojas em 1732. A maçonaria alcançou a França em 1730, espalhando-se rapidamente sob a égide da Grande Loja da Inglaterra.

Em 1733, foi criado o Grande Oriente da França tornando independentes e autônomas as Lojas daquele país. Sua influência estendeu-se rapidamente, fazendo com que os princípios maçônicos de liberdade, igualdade e fraternidade varressem a Europa. As Lojas se disseminaram com uma rapidez espantosa. A maçonaria atraiu a sociedade mais intelectualizada, a aristocracia, militares, escritores, músicos, poetas e filósofos. Isso fez crescer o debate e a livre discussão das idéias, contestando o Estado e a Igreja, ampliando a pregação de uma nova convivência entre os homens, sem preconceitos religiosos, sociais ou de raça.

Naquele momento da história ainda estava muito viva na memória de todos as guerras religiosas do passado que haviam devastado a Europa. O desejo de paz e tolerância concretizava-se no interior das Lojas, onde se rendia homenagem e glorificava-se o "Grande Arquiteto do Universo" em um ambiente de absoluta liberdade. Foi a época de ouro da maçonaria, em que ela adotou as idéias dos filósofos do Iluminismo, muitos deles maçons, quando se pregava a revolução universal pelo direito do homem a liberdade, a igualdade de deveres e obrigações de todos os cidadãos e a fraternidade entre todos os indivíduos.

Pregava-se discreta e subliminarmente nas Lojas a substituição dos regimes absolutistas por um regime constitucional, com um parlamento eleito pelo povo. A maçonaria nunca foi um partido político, mas após 1717 sempre teve em suas fileiras homens que atuaram fortemente na construção de uma sociedade livre e de bons costumes. Procurava-se evitar o debate político e religioso, mas as Lojas eram um espelho da sociedade em que viviam. Se a religião era praticamente comum a todos, os interesses políticos eram diversos, por isso em uma mesma cidade Lojas tinham direções diferentes.

Enquanto na França algumas Lojas defendiam a monarquia constitucional, outras lutavam pela república. No Brasil, anos mais tarde, nas lutas pela abolição da escravatura, aconteceu a mesma coisa. Havia na mesma Loja maçons a favor e contra a abolição. Outros constituíram Lojas diferentes, o que nunca enfraqueceu a instituição uma vez que a liberdade de pensamento sempre foi o mais preservado de todos os direitos.

Para a maçonaria, não é somente o aspecto político que é primordial. Além do ideário de liberdade, igualdade e fraternidade, as manifestações de cultura, a busca incessante da verdade, o respeito a natureza e ao homem sempre exerceram uma imensa atração para os mais diferenciados indivíduos, impressionados com o pensamento humanístico e filantrópico da instituição. Como era de se esperar, os governos absolutistas combatiam e proibiam com energia as reuniões maçônicas, não admitindo qualquer tipo de literatura ou manifestação.

A MAÇONARIA E A IGREJA

Desde a introdução da maçonaria na França, ela sempre foi vista com suspeição pela Igreja Romana, em virtude da sua pregação de máxima tolerância religiosa. Sucessivos Papas emitiram bulas, encíclicas e outras ordens proibindo os católicos de pertencerem à maçonaria sob pena de excomunhão. Houve intensas lutas políticas entre a instituição maçônica, o Estado e a Igreja.

Nesses momentos, os maçons que, por formação, eram ligados à Igreja em fé e devoção fizeram do segredo maçônico um elemento fundamental para a sobrevivência em uma vida dupla e por vezes perigosa, uma vez que são obrigados por seus regulamentos e rituais a seguir a lei de suas nações. A história da maçonaria em cada país é um relato de diferentes trajetórias e cada povo tem uma narração diferente sobre sua influência nos fatos ocorridos nos últimos séculos. Livre e tradicionalista na Inglaterra, revolucionária e republicana na França, emancipadora e republicana nas Américas, unificadora e guerreira na Itália, a sublime Instituição escreveu com letras indeléveis e gravou no coração de todos seus ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

AS TRÊS OBRIGAÇÕES INICIAIS DO MAÇOM



As três primeiras obrigações do maçom consistem no Silêncio, na Solidariedade e na Submissão.

A primeira é o Silêncio acerca de tudo quanto vier a ouvir, ver, descobrir e conhecer sobre a Ordem.

Declarando-se disposto a sujeitar-se a esta prática, o neófito é submetido ao teste da Taç.’. Sagr.’. quando jura “guardar o mais profundo silêncio” sobre todas as provas a que fosse exposta sua coragem.

Este dever é confirmado mais uma vez, desta feita de joelhos e solenemente em presença de Deus – O Supremo Arquiteto do Universo – quando então jura “nunca revelar os mistérios da Maçonaria” que lhe forem confiados.

Esse silêncio consiste no tradicional Sigilo Maçônico, uma vez que os assuntos de maçonaria e os ensinamentos maçônicos são dados, exclusivamente, a maçons regulares e em lojas regularmente constituídas.

A prática do Sigilo Maçônica se sustenta na sabedoria da Ordem cujos aspectos esotéricos não serão todos transmitidos no grau de Aprendiz.

A maçonaria instrui que o ensino esotérico não se faz proveitoso a não ser quando dedicado a quem esteja devidamente preparado para recebê-lo, isto é, capacitado para entender o seu real sentido.

Esta obrigação está em perfeita sintonia com as palavras de Jesus: “Não deis as coisas sagradas aos profanos e não lanceis vossas pérolas aos porcos”.

O Budismo também recomenda semelhante cuidado quando instrui: “Não turbe o sábio a mente do homem de inteligência tardia”. Hermes Trimegistos também apresenta a mesma doutrina (Hermetismo) com a expressão: “Os lábios da sabedoria estão mudos para os ouvidos da incompreensão”.

A segunda obrigação é a Solidariedade cuja doutrina ensina que devemos vencer as paixões ignóbeis e, em seu lugar, cultivar os sentimentos nobres que impulsionam a beneficência.

Devemos socorrer nossos irmãos, prevenir suas necessidades, mi-norar seus infortúnios, assisti-los com nossos conselhos e nossas luzes.

Também a Amizade é cultivada em nossos Templos como um dos fundamentos da doutrina maçônica.

Nunca devemos perder a oportunidade de sermos úteis ou de atendermos a um pedido de socorro.

A amizade antecede a fraternidade maçônica.

Só poderemos conhecer as virtudes e as limitações do nosso amigo se com ele convivermos nas várias circunstâncias que a vida nos oferece.

Por meio dessa convivência é que poderemos descobrir a vocação maçônica que nos levará a reconhecer no amigo um potencial irmão.

A Amizade é uma virtude que se manifesta sob a forma de dedicação, interesse, benevolência, tolerância, afetividade e sentimento de união permanente com o amigo.

Essa permanência é que leva à fidelidade, à solidariedade e à confiança mútuas, que se fortalecem naturalmente com o tempo e com a convivência fraterna.

A amizade cultuada na doutrina maçônica não é pois, um dever moral ou uma obrigação regimental.

É, antes de tudo, um dos resultados da verdadeira iniciação.

Em sendo fruto de uma metamorfose iniciática, a amizade fraterna é desinteressada, altruística e visa sempre ao bem e ao progresso do outro.

Quanto à terceira obrigação, a Submissão, que se caracteriza pela fidelidade à Ordem como uma das obrigações do Iniciado.

Ele se submete às suas leis e se alia aos seus fins.

A Lei é a maior autoridade do homem livre.

A solidariedade implica a observância de regras comuns na luta por um ideal coletivo livremente assumido.

A submissão é um dos elementos da virtude moral pela qual o homem livre acata e cumpre leis, ordens e determinações emanadas legitimamente.

Essa virtude de Obediência é uma atitude racional, forte, que se fundamenta no princípio da autoridade, na plena consciência dos requisitos do bem comum.

A submissão do homem livre não responde a estímulos da coerção, da exortação, da ameaça ou da recompensa material, mas, responde fielmente à sua consciência moral de fidelidade ao dever e ao compromisso livremente assumidos.

Extraído do livro “Instrucional Maçônico – Gr.’.de Apr.’., de Tito Alves de Campos, pg. 80, GOB, Brasília, DF – 2007).

 Quarta feira, 10h00, palestra no 3o. Batalhão do Corpo de Bombeiros de Anápolis, para uma turma de cerca de 40 pessoas. Foi muito emocionante falar aos heróis bombeiros. Agradeço ao Cel. Matheus e simpático Capitão Tiago Costa Chaves pela oportunidade.


Quarta-feira a noite, nas belas instalações do Hotel K, em Goiânia, participa da primeira noite de Pessach da Associação Cultural Israelita de Goiânia, com a presença de mais de 30 pessoas a convite do meu amigo Josué Parglender. Evento muito bem conduzido pelos confrades Amos Blanche e Dov G. Levi Najman. Noite de louvor pela liberdade da escravidão do Egito e comida judaica d-e-l-i-c-i-o-s-a. O Ir:. Sandro Ricardo e sua linda Pollyana e seus dois filhos também participaram.


Quinta-feira pela manhã. Palestra na empresa de software do meu amigo querido e Ir:. Sandro Ricardo,  VM da LM Reintegração e Concórdia, para os seus 35 funcionários. Em Julho visita Israel. Em agosto o meu Ir:. está triplicando o tamanho de sua empresa.


Quinta-feira a tarde palestra na Fábrica de Doces Real em Aragoiânia do meu Ir:. Alex. Fábrica linda, em enorme área cercada de eucaliptos, fabricando doces deliciosos que são vendidos para todo o Brasil e que as redes Extra e Carrefour comercializam com marca própria. Minha diabetes sofreu. Só o cheiro maravilhoso dos doces na fábrica já aumenta a taxa de glicemia.


Sexta-feira Santa, enfim descanso. Bom fim de semana a todos.

abril 17, 2022

O QUE É A PASCOA HEBRAICA - Gilberto Lyra Stuckert Filho.




PÁSCOA – Do hebreu pesach, pelo grego Páscha, pelo latim clássico Pascha. Festa realizada na primavera, originalmente consagrada à Eastra ou Ostra, divindade teutônica, “Deusa da Primavera e da Luz”. 

Este vocábulo veio a designar a festa cristã da ressurreição desde o século VIII, por tendências dos anglo-saxônios. Porém sua tradução se encontra correta, já que essa palavra é derivada do vocábulo grego “pascha”, que representa Páscoa. Posteriormente, a Páscoa foi adotada como uma festa das Igrejas Cristãs, em memória à “Ressurreição de Jesus Cristo”.

A Páscoa Cristã nada tem de semelhança com a Páscoa Judaica, já que esta última se trata de um festejo religioso, através do qual o povo hebreu comemorava a libertação, por Moisés, dos seus antepassados no Egito.

 De acordo com as Sagradas Escrituras, no primeiro mês, no décimo quarto dia do segundo ano após a saída do Egito, o Grande Arquiteto do Universo falou a Moisés no Deserto do Sinai. Dizendo-lhe: “Celebrem os israelitas a Páscoa no tempo fixado”. Moisés mandou aos israelitas que celebrassem a Páscoa, e esta foi celebrada no décimo quarto dia do primeiro mês. E no décimo quinto dia desse mesmo mês, será realizada a “Festa dos Pães sem Fermento”, em honra do Senhor, pois Ele assim disse: “Comereis pães sem fermento durante sete dias”. 

História Bíblica Sobre a Páscoa: O Senhor Deus, o Grande Arquiteto do Universo, falou a Moisés e a Arão no Egito. Ele disse: “Este mês será para vocês o primeiro mês do ano. Diga a todo o povo israelita que no dia dez deste mês, cada pai de família escolherá um carneirinho ou um cabrito para sua família, isto é, um animal para cada casa. Se a família for pequena demais para comer o animal inteiro, então o dono da casa e o seu vizinho mais próximo os comerão juntos, repartindo-o de acordo com o número de pessoas e a quantidade que cada um puder comer.

 O animal deverá ser um carneirinho ou um cabrito de um ano, porém sem defeito. Vocês o guardarão até o dia catorze deste mês. Na tarde desse dia todo o povo israelita matará os animais. Então, pegarão um pouco de sangue e o passarão nos batentes dos lados e nas décima das portas das casas onde os animais vão ser comidos. Nessa noite a carne deverá ser assada na brasa e comida com pães sem fermento e como ervas amargas. 

A carne não deverá ser comida crua nem cozida; o animal inteiro, incluindo a cabeça, as pernas e os miúdos, será assado na brasa. Não deixem nada para o dia seguinte e queimem o que sobrar. Já vestidos, calçando e segurando o bastão, comam depressa o animal. Esta é a Páscoa do Grande Arquiteto do Universo, o Senhor de Israel. 

Nessa noite eu passarei pela terra do Egito e matarei todos os primeiros filhos, tanto das pessoas como dos animais. E castigarei todos os deuses do Egito. Eu Sou o Senhor. O sangue nos batentes das portas será um sinal para marcar as casas onde vocês moram. Quando estiver castigando o Egito, eu verei o sangue e então passarei por vocês sem parar, para que não sejam destruídos por essa praga. 

Comemorem esse dia como festa religiosa para lembrar que eu, o Senhor Deus, fiz isso. Vocês e os seus descendentes devem comemorar a Festa da Páscoa para sempre”.


EDUCAÇÃO NATURAL NA MAÇONARIA - Charles Evaldo Boller


A escola pública na maioria dos países não contempla a educação natural, aquela que organiza os valores e princípios internos, preconizada pelo Movimento Iluminista, cujas bases foram lançadas por Rousseau (1712-1778) e complementadas por Kant (1724-1804). A educação que humaniza o homem não existe na escola pública moderna, em todos os países. A escola pública gratuita está voltada mais para a transmissão de conhecimento que para a formação do homem integral. Inclusive é negligente com a formação humana nos aspectos de incutir valores e princípios. O homem não é treinado para: pensar; meditar; desenvolver virtudes; emoções; e espiritualidade, mas para ser escravo do próprio homem. Com raríssimas exceções, escolas particulares educam de fato, incutem valores e espiritualidade junto com a formação para o mercado de trabalho. Mas estas escolas normalmente estão fora da realidade econômica da maioria da população.

A transmissão de conhecimentos está voltada para o Comércio e a Indústria, requisitos do Capitalismo, que exerce domínio absoluto em todos os níveis, em todas as escolas públicas ou privadas. Ganho financeiro é um poder ao qual o homem se submete. Negligencia-se o homem em sua trajetória pela vida e se favorece o aparecimento de criaturas com graves crises existenciais, frustradas de tal forma que chegam a não dar mais o devido valor à própria vida. Vive-se o momento e apenas para si mesmo. Os próprios filósofos alardeiam que a vida humana não tem finalidade alguma, que em sua jornada pela biosfera o homem é apenas objeto de eventos aleatórios. Sem a educação natural o homem está condicionado para apenas gozar da vida e fugir das vicissitudes ao invés de enfrentá-las. A única perspectiva futura daquele que não obteve este tipo de educação é de sumir no nevoeiro do tempo de onde lhe foi dito que foi gerado a partir da evolução de bactérias, algas, fermentos, fungos, esponjas, águas-vivas e vermes, para uma não existência, um esquecimento eterno.

Abrir escolas incentiva a ciência, mas não intensifica a consciência; sentimento ou conhecimento que permite ao ser humano vivenciar, experimentar ou compreender aspectos ou a totalidade de seu mundo interior. Na existência de mais consciência, o número de vagas ocupadas nas cadeias diminuiria. Mesmo toda a informação e ciência produzidas pelas escolas podem fechar uma prisão sequer se a sociedade não se conscientizar da necessidade do desenvolvimento da consciência, da moralidade e do bem.

O que antigamente era desenvolvido no seio da família deveria ser ministrado na escola pública, já que pai e mãe, quais escravos, são obrigados a trabalhar debaixo do sistema. Entretanto, a escola pública limita-se em transmitir conhecimento voltado para mercado de trabalho que escraviza, enquanto o treinamento das emoções, sentimentos, sentidos e instintos são negligenciados. Ações que o bom senso recomenda como fundamentais para diminuir o número de presidiários e gerar cidadãos felizes, equilibrados e socialmente integrados. A educação dos potenciais latentes em cada um aproxima o homem de sua condição humana. Educação é consciência, instrução é ciência; ambas sustentam o corpo; a mais importante é a invisível consciência.

Nem religiões, e muito menos governos tratam a educação com a seriedade que deveriam. Governos querem transmitir instrução, religiões restringem-se a moral e assim o homem fica incompleto. Descartes (1596-1650) disse: "Toda a filosofia é como uma árvore: as raízes são a metafísica, o tronco é a física e os ramos são todas as outras ciências". Usando deste pensamento, o homem moderno está incompleto na raiz. Não existe alicerce. Aquilo que não se vê. Sabe-se que existe, mas fica enterrado dentro da pessoa. A escola constrói o homem material, apenas o que da árvore aparece acima do solo; preocupa-se apenas com tronco e folhas. As raízes são complexas necessidades que dão razão para viver e não se restringem apenas à moralidade.

A religião deveria preocupar-se com o alicerce e completar o que está invisível, mas isto não acontece! Centenas as religiões apenas exploram as pessoas em seus metais e as enganam com fantasias. Durante um curto espaço de tempo até é possível enganar alguns, mas é difícil manter mentiras por muito tempo. Acrescente-se que todas as religiões fundamentam seu poder no medo de muitos e na inteligência de um grupo reduzido que lhes definem os descaminhos, sempre voltados ao domínio e opressão pelo medo. Todos os esforços, da absoluta maioria das religiões, estão voltados para um aviltante senhor e único amo: o valor financeiro. A religião coloca de um lado um diabo e de outro um salvador. Enquanto um leva o homem à perdição o outro supostamente o resgataria. Em grosso modo, as maquinações teologais buscam fora do homem a solução de suas incertezas e angústias existenciais; e só se manifestam se sua ação for possível de converter em ganho de qualquer natureza; principalmente financeira e política. Diante desta realidade, que é constante em todas as civilizações, não se constrói ou se fortalece a raiz, o alicerce invisível que mantém o homem de pé frente às tempestades e incertezas da vida. Fica o homem jogado de um lado ao outro ao sabor de tentações e redenções.

Na ausência de formação integral e do despertar da consciência o desenvolvimento do homem fenece e de sua essência apodrece-lhe a raiz nos porões da sociedade, raízes atadas por inquebrantáveis grilhões; indestrutíveis porque são usados voluntariamente, no exercício do livre arbítrio. A conseqüência do livre arbítrio é o homem ser o único ator da construção de sua vida e responsável tanto pelo mal como pelo bem que produz. Ele é responsável por todas as suas ações, independente de prêmio ou castigo, céu ou inferno, ser bom ou mau. Se o homem não gozasse de um projeto que o criou livre e independente, de nada serviria educação de qualquer tipo; bastaria seguir o que lhe fosse ditado pelos instintos. Mas não é assim. O homem é responsável por sua história porque foi dotado de livre arbítrio e nenhum intermediário, homem santo ou clérigo religioso o poderá salvar; nem mesmo Deus interferirá, porque o Grande Arquiteto do Universo criou o homem independente, livre, dotado de livre escolha. Se o Criador interferisse nas ações da criatura seria como admitir a existência de erros em seu projeto. É devido a isto que a Maçonaria ensina que liberdade vem sempre acompanhada de responsabilidade. Quem escraviza é o próprio homem. E o que é ilógico, o homem escraviza a si mesmo. Ao longo da história homem vem explorando homem em seu próprio prejuízo. É dominado à força ou se deixa dominar em virtude de suas limitações e vícios.

No convívio social eclodem choques de todos os tipos. A violência alcançou patamares insustentáveis. Se buscadas razões fora de si, a culpa pela violência é do meliante que pratica a violência. Mas ao lume da fria razão a culpa é partilhada com o omisso que se prende atrás das grades e muros de seu castelo, pensando que isolando a violência lá fora será poupado de sua ação. Diz o sábio que o silêncio dos bons é tão responsável pela maldade quanto o grito dos violentos, dos corruptos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética. Felizmente os maus ainda constituem minoria. O problema é que a sociedade está cada vez mais tolerante e omissa no tratamento com o mau. O egocentrismo cria legiões de omissos e materialistas. Resguardam-se na ilusão de que o mal nunca cairá sobre eles e por covardia e omissão deixam o mal crescer. Mas como a realidade mostra, o mal sobrevirá para todos os que o provocam, seja por ação ou por omissão. O cidadão bom está por detrás das grades enquanto o meliante está do lado de fora tentando levar vantagem. A sociedade corre atrás de corrigir o mal depois de feito e pouco se faz de forma preventiva através da educação.

Se o homem fosse apenas produto do meio de nada adiantaria também qualquer tipo de educação. Seria simplíssimo! Para resolver os problemas de violência bastaria modificar as circunstâncias do meio em que o homem vive. Afastá-lo da sociedade que o perverte; como o Emílio descrito por Rousseau. Se apenas o meio modificasse o homem para o bem, então todo maçom seria só candura! Mas a realidade não é assim! Ser bom ou mau é questão de escolha, de exercer o poder do livre arbítrio para o bem ou para o mal, e isto é modificável pela educação. Incentivados pela Maçonaria, autoconhecimento e auto realização são caminhos para amenizar o mal porque usam do poder do livre arbítrio do próprio homem para o bem.

Na política, o nebuloso clima de corrupção e a sensação de impunidade deixam a todo bom cidadão desalentado. Isto porque o homem transfere poder aos maus ao vender seu voto. Desta forma os maus estão no poder criando leis cada vez mais complexas e intrincadas de modos que ao meliante fica fácil constituírem defensores matreiros que os defendam na Justiça. E para complicar ainda mais, a Justiça - brasileira - é tão lenta em responder aos anseios do bom que é como se ela sequer existisse. A sensação de impunidade é insuportável!


Se a escola pública realmente educasse o homem conforme preconizado pelos iluministas, e não apenas o instruísse para o trabalho assalariado, a forma de escravidão moderna, a realidade social seria muito diferente. A Maçonaria oferece a educação natural e basta ao maçom aproveitar da oportunidade oferecida e partir para se auto-educar nos moldes ditados por homens como Rousseau e Kant. O ideário educacional iluminista traçou o caminho de uma época de escravidão ao absolutismo imperial e clerical e pavimentaram caminhos para a democracia e o capitalismo, realidades que apresentam hoje outras nuanças e dificuldades. Os eventos que sucederam os ideários humanitários e pacifistas dos iluministas tornaram-se sucessões de impérios de terror e amarguras. Para os iluministas do século das luzes a violência desencadeada depois de sua atuação destruiu os resíduos de esperança que ainda lhes restavam. Foram revoluções e guerras globais revestidas de muita maldade, do jorrar de muito sangue inocente, de acendimento e manutenção de muito ressentimento. A paz só é mantida pela guerra; são guerras preventivas em todos os quadrantes do Orbe. A constante é sempre o homem explorando o próprio homem.


Quantos hoje são os que seguem a única lei, a do amor fraterno, ditada por grandes iniciados do passado? Ritualística, simbologia e alegorias são ferramentas pedagógicas da Maçonaria programadas como portadoras de mensagens de homens do passado para os homens ao futuro, que é o hoje. A educação natural preconizada por Rousseau e Kant ainda está em sintonia com a dinâmica social de nossos dias. Cabe ao maçom usar da oportunidade que a ordem maçônica oferece e desenvolver em si consciência e valores morais com vistas à sabedoria que conduz a felicidade da humanidade. É a razão de ser designado construtor social. O bom senso indica que a tarefa do malho e do cinzel ainda não terminou. Cabe ao maçom morrer e renascer diversas vezes e ressurgir sempre renovado de dentro da pedra bruta e disforme para servir de pedra angular na construção de templos vivos, purificados da maldade que o homem desenvolve quando se sociabiliza. Certamente o Grande Arquiteto do Universo, através daquilo que inspira o maçom a pensar com sabedoria, proverá as Luzes necessárias para iluminar os caminhos do futuro e usar da Sublime Instituição para a libertação do homem dominado pelo próprio homem.


Bibliografia:

1. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda, História da Educação e da Pedagogia, Geral e Brasil, ISBN 85-16-05020-3, terceira edição, Editora Moderna Ltda., 384 páginas, São Paulo, 2006;

2. ROHDEN, Humberto, Educação do Homem Integral, primeira edição, Martin Claret, 140 páginas, São Paulo, 2007;

3. ROUSSEAU, Jean- Jacques, Emílio ou Da Educação, R. T. Bertrand Brasil, 1995.

VOCÊ É DESNECESSÁRIO PARA A ORDEM?



Uma das situações, talvez a mais dolorosa para um homem, é quando ele se conscientiza de que é totalmente desnecessário, seja no ambiente familiar, no trabalho, na comunidade ou, principalmente, para nós maçons, na nossa Instituição.

Os maçons tornam-se desnecessários:

Quando decorrido algum tempo de sua Iniciação ao primeiro grau da Ordem, já demonstram desinteresse pelas sessões, faltando constantemente, demonstrando não estarem comprometidos com a Instituição, apesar de terem aceitado a Iniciação e terem JURADO SOLENEMENTE.

Quando, durante as sessões, já "enturmados", ficam impacientes com as instruções, com as palestras ou com as palavras dos Irmãos mais velhos, achando tudo uma chatice, uma bobagem que atrasa o ágape e a esticada noturna ao BAR.

Quando, ao tempo da apresentação de trabalho para aumento de salário, não têm a mínima ideia dos assuntos dentre os quais podem escolher os seus temas. Simplesmente copiam alguma coisa de um livro e apresentam-no, pensando que ninguém vai notar.

Quando, ainda companheiros, começam a participar de grupos para ajudar a eleger o novo Venerável e, não raro, já pensando seriamente em, assim que chegarem a Mestres, começarem a trabalhar para obter o "poder" na Loja.

Quando já como Mestres, recusam-se a admitir que sabem quase nada a respeito da Ordem Maçônica. Acham que estudar e comparecer ao máximo de sessões do ano é coisa para os que aceitaram fazer parte da administração, para os companheiros e os aprendizes.

Quando Mestres, ao participarem das eleições como candidatos a algum cargo na Loja, principalmente para o de Venerável, e não forem eleitos, sumirem ou filiarem-se a outra Loja onde poderão ter a "honra" de serem cingidos com o avental de M∴ I∴, que consideram ser " muito mais vistoso do que o de um "simples Mestre “.

Quando já Mestres e até participando dos graus filosóficos não terem entendido ainda que o essencial para o verdadeiro maçom é o seu crescimento espiritual, a sua regeneração, a sua vitória sobre a vaidade e os vícios, a aceitação da humildade e o bem que possam fazer aos seus semelhantes, e que, a " política interna da Loja, a proteção mútua, principalmente na parte material, também tem lá seu valor, mas não é a ESSÊNCIA para o verdadeiro MAÇOM.

Quando, como Aprendiz, Companheiro ou Mestre, ainda não entenderem que a Loja necessita que suas mensalidades estejam rigorosamente em dia, para que possam enfrentar às despesas que são inevitáveis.

Quando, como Veneráveis Mestres, deixam o caos se abater sobre a Loja, não sendo firmes o suficiente para exercer sua autoridade; não tendo um calendário com programação pré-definida para um período; não cobrando de seus auxiliares a consecução das tarefas a eles determinadas, e não se importando com a educação maçônica, que é primordial para o aperfeiçoamento dos obreiros.

Quando, como Vigilantes, não entenderem que, juntamente com o Venerável Mestre, devem constituir uma unidade de pensamento, pois em todas as Lojas nas quais um ou os dois Vigilantes não se entendem entre si e principalmente não se entendem com o Venerável, o resultado da gestão é catastrófico.

Quando, como Guarda da Lei (Orador), nada sabem das leis e regulamentos da Potência e de sua própria Loja, e usam o cargo apenas para discursos ocos e intermináveis.

Quando, como Secretários, sonegam à Loja as informações dos boletins quinzenais, as correspondências dos Ministérios e, principalmente, os materiais do departamento de cultura, que visam dotar as Lojas de instruções e conhecimentos que normalmente não constam dos rituais, e são importantes para a formação do maçom.

Quando, como Tesoureiros, não se mostram diligentes com os metais da Loja, não se esforçam para manter as mensalidades dos Irmãos em dia e não se importam com os relatórios obrigatórios e as prestações de contas.

Quando, como Hospitaleiros, não estão atentos aos problemas de saúde e dificuldades físicas, financeiras, ou sociais dos Irmãos da Loja. Quando constatamos que em grande número de Lojas, com uma frequência média de vinte Irmãos, se recolhe um tronco de beneficência de R$ 10,00 (dez reais) em média (significa que 10 irmãos contribuíram com R$ 1 ,00 e 10 não conseguiram nem contribuir...).

Na prática, em condições originais, friamente, todos os 10 que não contribuíram são desnecessários, pois a benemerência é um dever declarado do maçom. Mas a benemerência é também do maçom que PODE mais, atendendo o maçom que agora não está podendo, por seu acidentais motivos de vida.

Quando, como Chanceleres, não dão importância aos natalícios dos Irmãos, cunhadas, sobrinhos e de outras Lojas. Quando, em desacordo com as leis, adulteram as presenças, beneficiam Irmãos que faltam e não merecem esse obséquio.

Quando a Instituição programa uma Sessão Magna Branca para homenagear alguém ou alguma entidade pública ou privada, constata-se a presença de um número irrisório de Irmãos, dando aos profanos uma visão negativa da Ordem, deixando constrangidos aqueles que se dedicaram e se esforçaram para realizar o evento à altura da Maçonaria. Todos esses Irmãos indiferentes, que não comparecem habitualmente a essas sessões, também são desnecessários à nossa Ordem.

Muito mais haveria para se dizer em relação aos Irmãos desinteressados da nossa Sublime Instituição. Fiquemos por aqui e imploremos ao Grande Arquiteto do Universo que ilumine cada um de nós, para que possamos agir na Maçonaria com o verdadeiro Espírito Maçônico e não com o espírito profano, e roguemos ainda, que em nenhuma circunstância, seja na família, no trabalho, na sociedade ou na Arte Real, tornemo-nos desnecessários, pois deve ser muito triste e frustrante para qualquer um sentir-se sem importância e sem utilidade no meio em que se vive.

Fonte: Transcrito da revista O Delta. Colaboração do Irmão Gerson Luiz M.de Almeida



abril 16, 2022

PRANCHA DE TRAÇAR - Ir.'. Rui Bandeira



Na Antiguidade, a especialização era muito menor. O Mestre Construtor era uma mistura de arquiteto, mestre de obras, engenheiro, paisagista, decorador de interiores, canteiro, escultor, metalúrgico, enfim, parte daquilo que as nossas mulheres ainda hoje pretendem que nós sejamos lá em casa...

Na Idade Média e no Renascimento, as corporações de construtores em pedra também tinham estruturas (Lojas) dirigidas por Mestres construtores, que exerciam as funções de arquiteto, engenheiro e diretor de obra, além de assegurar também as de gestor e formador.

Como hoje, a construção de uma edificação que ultrapassasse a rusticidade implicava a prévia laboração de um mais ou menos complexo e detalhado projeto. O desenho desse projeto era, na falta de papel, executado em material durável, transportável, leve, que se transportava enrolado e que se consultava estendido sobre e preso a uma prancha de madeira.

Mesmo a própria ação de desenhar o projeto era efetuada com o suporte do desenho colocado sobre e preso a uma prancha. Ali se desenhavam os planos da obra, ou, utilizando a linguagem da época, se traçavam os planos. E a prancha sobre a qual os planos eram traçados era denominada, naturalmente, a prancha de traçar.

A prancha de traçar era, pois, um indispensável instrumento do Mestre Construtor e o símbolo da sua atividade. Era o Mestre quem traçava, não os restantes operários da construção, pelo que a prancha de traçar era o instrumento do Mestre. Sempre que era preciso detalhar qualquer aspecto da obra, desenvolver qualquer solução, o Mestre ia à prancha traçar o trabalho.

A língua evolui. Uma mera questão de tempo mediou a passagem entre a expressão “ir à prancha” (traçar um projeto, desenhar um detalhe) e “fazer uma prancha”. E, quando se faz uma prancha, então a “prancha” é o trabalho feito.

A Maçonaria Especulativa herdou e desenvolveu as tradições vindas da Maçonaria Operativa, das Corporações de Construtores. Assim, na Maçonaria Especulativa o instrumento próprio do Mestre Maçom é a prancha de traçar. E o trabalho que o Mestre Maçom executa e apresenta em Loja é uma “prancha traçada”. Abreviadamente, uma “prancha”.

Mas, embora sejam os Mestres quem tem a obrigação de zelar pela formação de todos os obreiros (incluindo a dos outros Mestres e a deles próprios, pois um Mestre Maçom deve considerar-se um eterno aprendiz), não são só os Mestres quem apresentam trabalhos em Loja. Companheiros e Aprendizes também o fazem, como demonstração dos seus progressos na Arte Real. 

Todo o trabalho apresentado em Loja se denomina uma prancha. E é irrelevante para essa denominação a natureza do trabalho: pode ser um texto ou uma obra de arte, uma música ou uma peça em pedra. O que importa é que se trate de um trabalho de um Maçom para Maçons, que se destine a testemunhar ou a colaborar no aperfeiçoamento individual ou coletivo.

Pode ser sobre matéria de exposição ou interpretação simbólica, pode ser uma reflexão filosófica, uma manifestação artística, uma exposição científica ou a mera divulgação de um fato. Feita por Maçom para Maçons -- e apresentada em Loja -- é uma prancha.

BOOZ e BOAZ - Rodrigo Peñaloza_


Nas Lojas brasileiras muito se confunde quanto à forma correta do nome Boaz, uns dizendo Booz, outros Boaz. Neste texto, eu procuro mostrar duas coisas. Primeiro, que o correto é Boaz, o que, aliás, é trivial, pois, para tanto basta observar a pronúncia hebraica. Em segundo lugar — e principalmente — , eu procuro dar uma explicação sobre o porquê de os tradutores antigos, ao escreverem a Septuaginta e a Vulgata, optaram pela transliteração incorreta do nome.

O termo Boaz aparece 18 vezes no Livro de Ruth, 3 vezes nas Crônicas, 1 vez em 1 Reis, 1 vez em Mateus e 1 em Lucas.

Na edição maçônica norte-americana da Bíblia Sagrada (Heirloom Bible Publishers, Kansas), o termo é Boaz. Na Encyclopedia of Freemasonry, de Albert Mackey (1917), é Boaz. Em Light on Masonry, de Elder D. Bernard (1828), é Boaz. O Manual of Freemasonry, de Richard Carlile (uma exposée da Maçonaria publicada aos poucos na revista The Republican, em 1825), é Boaz. No The Complete Ritual of the Scottish Rite Profuselly Illustrated, editado por um Soberano Grande Comendador (anônimo), 33o, e complementado por J. Blanchard, no século XIX (sem data), é Boaz. Em Morals and Dogma, de Albert Pike (1871), é Boaz.

Em todas as obras antigas, enfim, o termo é Boaz. Isso não nos surpreende, se observarmos que na escrita hebraica massorética, o que temos é בֹּ֫עַז (Bṓʿaz) e que, além disso, não existem vogais repetidas no Hebraico, de modo que Booz é uma pronúncia incorreta. Nos tempos modernos, o Irmão Harry Carr, em seu artigo “Pillars and globes, columns and candlesticks”, publicado em Ars Quatuor Coronatorum, Transactions of the Quatuor Coronati Lodge №2076 London, em 2001, e apresentado antes na Vancouver Lodge of Education and Research, em 20 novembro de 1998, é Boaz. Nesse artigo, Harry Carr reproduz alguns trechos de exposées publicadas entre 1760 e 1765, nos quais o termo é Boaz.

Por que, então, alguns autores nacionais insistem que o correto é Booz ou, quando muito, que tanto pode ser Booz quanto Boaz? Há duas razões para esse erro. O primeiro deles — e mais óbvio — é o desconhecimento do Hebraico. Em geral o argumento usado é que na escrita hebraica antiga não existiam vogais até o surgimento dos sinais massoréticos (século X), o que, segundo eles, justificaria qualquer pronúncia. Porém, não atentam para o fato de o Hebraico não admitir vogais repetidas, o que prontamente elimina Booz, de modo que, neste caso, a suposta ambivalência não existe.

A segunda razão está nas traduções portuguesas da Vulgata. De fato, na Vulgata o termo é Booz. Se São Jerônimo (347–420 d.C.) traduziu o Antigo Testamento diretamente do Hebraico para o Latim, por que optou por Booz e não Boaz? Só vejo duas explicações. Primeiro, em sua época, ainda não existiam os sinais massoréticos, que indicam as vogais. Somente alguém absolutamente fluente em Hebraico poderia ler corretamente o texto hebraico. São Jerônimo, porém, era ilírio e só aprendeu Latim e Grego no início de sua vida adulta. Quando maduro, mudou-se para Jerusalém para estudar Hebraico. É bem provável que, diante de uma dúvida, consultasse a Septuaginta, a versão grega da Bíblia, que também traz Booz (Βοος, que deve ser lido como Βοός, pois não é possível, por razões morfológicas, dizer Βόος em Grego).

Nessa série encadeada de porquês, surge mais um. Por que a Septuaginta traz Booz e não Boaz? Por uma razão muito simples. Boaz é nome próprio e é oxítono. Em Grego, um nome próprio masculino pode terminar em –ας, como ὁ Ξανθίας (cuja pronúncia é ksanthías, donde veio o nosso Xântias), mas não pode jamais ser oxítona. O mesmo ocorre com os substantivos terminados em –ας, como ὁ νεανίας (o jovem), que não podem ser oxítonos. Por outro lado, substantivos terminados em –ος podem ser oxítonos, como θεόϛ (theós, pronuncie the-ós, com o th ligeiramente aspirado).

Dessa forma, os sábios que verteram a Bíblia para o Grego podem ter optado por Booz (Βοός) em vez de Boaz apenas para preservação do acento tônico na última sílaba, uma exigência natural se a intenção era não desvirtuar demais a pronúncia de um nome próprio e fazê-lo ser entendido pelo leitor ou ouvinte grego. Em outras palavras, se a intenção era fazer a história bíblica minimamente inteligível ao grego, os tradutores tinham de resolver a seguinte questão: ou preservavam a grafia BOAZ mas trocavam o acento tônico da última para a penúltima sílaba (ou seja, Bóaz) ou trocavam Boáz para Boós e preservavam a oxítona. O nome Boáz, oxítono, soaria muito estranho ao ouvido grego, mas não Boóz e tampouco Bóaz. O que é mais próximo de Boáz: Bóaz ou Boóz? Eles julgaram que era Boóz. Dessa forma, São Jerônimo, mesmo que estivesse ciente da correta pronúncia hebraica, pode ter optado por Booz por influência da Septuaginta, tendo preferido, sabiamente, manter uma coerência entre a versão latina e a versão grega já estabelecida há séculos.

Os autores maçônicos antigos devem ter sabido disso, pois todos, no mínimo, eram fluentes em Latim, com boas noções de Grego e alguns até de Hebraico, além de, sendo em sua maioria protestantes, terem em mãos a versão protestante da Bíblia, que, ao contrário da Vulgata, trazia Boaz, graças ao gênio de Lutero. Textos não-maçônicos também trazem Boaz, como Historiarum Totius Mundi Epitome, seção 16, de Cluverius Johannes, de 1667.

Conclui-se, assim, que a pronúncia correta é Boaz e que, além disso, Booz é apenas a herança de uma característica fonética do idioma Grego, que herdamos por intermédio da Vulgata. A opção pelo aparente erro fonético se deve à perspicácia dos antigos tradutores, convictos que estavam de tornar esse e outros nomes hebraicos inteligíveis aos ouvidos gregos, sem prejuízo do significado mais profundo das histórias que traduziam.

Rodrigo Peñaloza é Ph.D em Economia pela University of California at Los Angeles (UCLA), M.Sc. em Matemática pelo Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) e Ba. em Economia pela UnB. É Prof. Adjunto do Depto de Economia da UnB. MI, filiado à Loja Maçônica Abrigo do Cedro n° 08 GLMDF.